Questão
TJ/RS - Concurso para Juiz de Direito Substituto - 2009
Org.: TJ/RS - Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
Disciplina: Direito Processual Penal
Questão N°: 009

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Enunciado Nº 000292

Diante do recebimento da denúncia por delito de estelionato, a defesa ingressou com habeas corpus, sustentando a ausência de justa causa para o exercício da ação processual penal (art. 395, inc. 111. do CPP), postulando o "trancamento da ação" (expressão constante na inicial). Concomitantemente, no prazo de resposta (art. 396 do CPP), a defesa afirmou ser evidente não constituir crime o fato narrado. Tanto no remédio jurídico de habeas corpus quanto na resposta, a defesa do imputado refere, expressamente, ter sido exercida a "pretensão punitiva" pelo Ministério Público na denúncia. Considerando o enunciado e o disposto nos arts. 395, 396, 397 e 648, inc. 1, todos do CPP, bem como a precisão terminológica conceitual, responda fundamentadamente:


a) o que se entende por justa causa para o exercício da ação processual penal?


b) quais são as condições da ação processual penal e qual seu significado?


c) há distinção entre pretensão acusatória e pretensão punitiva?


d) caso a denúncia, quando do seu oferecimento, também descrevesse e qualificasse outro delito, como o de ameaça, conexo com o de estelionato, como deveria proceder o juiz?

Resposta Nº 002664 por André


a). A justa causa para o exercício da ação processual penal consiste no lastro probatório mínimo para o exercício do direito de ação. Como a atuação do Estado na persecução penal deve ser responsável, evitando-se a imputação temerária de condutas delituosas, exige-se a presença de um mínimo de provas que embase a acusação. Atualmente, a justa causa é prevista como causa de rejeição da denúncia ou queixa (art. 395, I, do Código de Processo Penal - CPP).

Há ainda previsão para a justa causa como fundamento para a impetração de habeas corpus (art. 648, inciso I, do CPP). Mas, é importante apontar que os conceitos não se confundem. Como fundamento para o habeas corpus, a justa causa deve ser entendida de forma mais ampla, como sendo a ausência de qualquer fundamento de fato ou de direito para a coação.

b). Tradicionalmente, e na esteira do posicionamento eclético de Liebman, as condições da ação são três: legitimidade ad causam, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido.

Embora o direito de ação seja autônomo (não se confunde com o direito material) e abstrato (independe do resultado do processo), consolidou-se no Brasil a teoria eclética, de modo que a prolação de uma sentença de mérito após o exercício do direito de ação, está condicionada ao preenchimento de certas condições, que são justamente as condições da ação.

A legitimidade ad causam é a pertinência subjetiva da demanda, ou seja, a legitimidade para ajuizar ações, no caso, ações penais. Por exemplo, o Ministério Público tem legitimidade para ajuizar as ações penais públicas (incondicionadas ou condicionadas, desde que presente a representação do ofendido ou a requisição do Ministro da Justiça; art. 129, I, da Constituição Federal; art. 24 do Código de Processo Penal; dentre outros). Essa legitimidade pode ser ativa (para figurar no polo ativo) ou passiva (para figurar no polo passivo).

O interesse de agir exige a presença de três requisitos: necessidade, adequação e utilidade. A partir da máxima nulla poena sine judicio, é possível concluir que o processo penal é necessário para a imposição da pena. Trata-se de um corolário de princípios constitucionais, como o devido processo legal (art. 5º, XXXV) e da individualização da pena (art. 5º, XLVI).

A adequação, no que pertine à pretensão acusatória, não traz maiores celeumas, visto que o instrumento adequado para a imposição de pena é o ajuizamento de uma ação penal condenatória. Já no que se refere a processos penais não condenatórios, ganha relevo o disposto na súmula 693 do Supremo Tribunal, que afasta a impetração de habeas corpus quando o risco se reduzir à aplicação de uma pena de multa.

Já a utilidade requer que o processo penal seja útil para o fim a que se busca. Há quem defenda aqui, a possibilidade de reconhecimento de prescrição virtual da pretensão punitiva, ou seja, aquela tomada a partir de cálculos hipóteticos da pena, evitando-se a postergação do processo quando se sabe que a prescrição será reconhecida posteriormente. Apesar de existir forte entendimento admitindo-a, o Superior Tribunal de Justiça editou o enunciado n. 438 da súmula de sua jurisprudência afastando a possibilidade de reconhecimento da prescrição com base em pena hipotética (prescrição virtual ou antecipada).

Por fim, a possibilidade jurídica do pedido exige que o fato descrito pelo Ministério Público seja típico. Só há a possibilidade de aplicação de pena se houver a narração de um fato típico. Mas aqui há a necessidade de uma ressalva. Já com Liebman, houve o afastamento da possibilidade jurídica do pedido como uma das condições da ação, sob o argumento de que a matéria estaria inserida no próprio mérito do processo. O Código de Processo Civil de 2015 adotou esta alteração e inseriu os casos de impossibilidade jurídica do pedido como matéria de mérito, cuja ausência importa em improcedência liminar do pedido (art. 332). Em razão disto, a doutrina processualista penal tem trabalhado apenas a legitimidade ad causam e o interesse de agir como condições da ação, reconhecendo a possibilidade jurídica do pedido como matéria de mérito.

Finalmente, há entendimento capitaneado por Afrânio Silva Jardim no sentido de que a justa causa se revelaria como uma quarta condição da ação penal. Não há unanimidade neste posicionamente, visto que as condições da ação estão ligadas aos elementos da mesma ação, quais sejam, as partes (legitimidade ad causam), a causa de pedir (interesse de agir) e o pedido (possibilidade jurídica do pedido). Assim, como a justa causa não guardaria correspondência com os elementos da ação penal, não seria ela uma nova condição da ação.

A partir destas lições, há quem sustente que a justa causa é parte integrante do próprio interesse de agir, apontando que não haveria este interesse quando ausente um lastro probatório mínimo. Finalmente, há ainda que insira a justa causa como um requisito indispensável para o oferecimento da peça acusatória (denúncia ou queixa), revelando-se este , a nosso ver, como o melhor posicionamento a ser seguido.

Por fim, ao lado das condições da ação acima, ditas genéricas, existem as condições específicas da ação, variáveis a depender do delito (ex.: nos crimes praticados no estrangeiro, exige-se a entrada do agente em território nacional nos casos de extraterritorialidade condicionada - art. 7º, §2º, alínea "a", do Código Penal; a representação do ofendido ou de seu representante legal, nos crimes cuja ação penal é condicionada à sua representação; etc.).

c). A pretensão acusatória refere-se ao direito potestativo de que dispõe a acusação de imputar a alguém a prática de uma infração penal, requerendo a aplicação da respectiva pena. Trata-se de um direito potestativo, mas que é regido pelo princípio da obrigatoriedade: presente justa causa, a ação deve ser ajuizada.

A pretensão punitiva, por seu turno, é a pretensão do Estado de punir o autor de uma infração penal, cuja culpa fora reconhecida após o devido processo legal.

Assim, a rigor, foi exercida a pretensão acusatória pelo Ministério Público.

d). Havendo a imputação do delito de ameaça, o magistrado deveria ainda verificar a presença de outra condição da ação, mais precisamente de uma condição específica da ação, que é a representação do ofendido ou de seu representante legal dentro do prazo decadencial de seis meses a contar do dia em que tomou conhecimento da autoria (art. 147, parágrafo único, c/c arts. 100, §1º e 103 do Código Penal; e arts. 38 e 39 do Código de Processo Penal).

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