Quando uma comunidade tem prática cultural que submete animais à crueldade, há conflito entre bens jurídicos. É possível que a comunidade seja uma minoria étnica.
a) Defina os bens jurídicos em conflito, no contexto do ordenamento jurídico brasileiro.
b) Ofereça uma solução, com base nos paradigmas antropocêntrico, biocêntrico e culturalista. (Esclarecemos que não é preciso conceituar cada um desses "paradigmas" nem considerar que todos são independentes entre si; eles apenas devem ser explicitamente levados em consideração) .
c) Comente a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto .
(Máximo de 60 linhas. O que ultrapassar não será considerado)
a) Encontra-se em conflito a proteção à fauna, estabelecida no art. 225, §1o, VII, da CF/88 e o exercício dos direitos culturais nas suas diversas manifestações, previsto no caput do art. 215, ambos da CF/88.
b) Prevendo que uma sociedade plural e em constante desenvolvimento pode vir a ter interesses conflitantes, no que diz respeito à colisão de direitos fundamentais de base constitucional, Alexy propõe a adoção da técnica de ponderação. De acordo com a referida técnica, as soluções devem ser pensadas e implementadas de modo que não haja o sacrifício de nenhum dos valores, especialmente porque estão relacionados à Dignidade da Pessoa Humana.
No caso em questão, há que se respeitar a opção do constituinte de tutelar ambos os valores, interpretando-se o ordenamento jurídico como um todo. É reconhecido que o caput do art. 225, da Constituição reflete uma corrente antropocentrica, ou seja, uma proteção do meio ambiente, como instrumento à proteção do ser humano. Porém, prosseguindo-se na análise do art. 225, verifica-se no inciso VII, do §1o, que também houve a adoção do biocentrismo, na medida em que protege todas as formas de vida, colocando-a a salvo de condutas cruéis.
O culturalismo, entendido como uma perpetuaçõa de um estilo de vida e uma forma de proteção de identidade dos povos, carrega consigo de forma intrinseca a historicidade de suas práticas. Evidentemente, muitas delas têm como parâmetros valores mais tradicionais de épocas antigas. A despeito de ser um valor que deve ser protegido, não se pode descurar que o avanço da tecnologia e a disseminação fácil de informações, muitas condutas que antes eram tidas como inofensivas são reavaliadas.
Nesse sentido é a discussão em grande parte do mundo de culturas de multilação de partes do corpo humano, por exemplo. No que tange aos animais, há uma série de estudos que os reconhecem como serem sencientes, ou seja, capazes de sentir medo, dor, estresse, entre outros sentimentos igualmente danosos aos seres humanos. Assim, o tratameto que lhes é concedido deve ser reanalisado à luz dessas novas premissas.
O fato de que determinados atos cruéis contra animais decorrerem da perpetuação de cultura não é, por si só, elemento suficiente para justificar a permissão na manutenção de tais atos. Isso porque é possível que a cultura permaneça protegida, a despeito da proibição de tais práticas, pois ela se manifesta de diversos modos e há diversos instrumentos para a sua proteção.
Por outro lado, a danosidade que os atos crueis trazem aos animais, a despeito dos avançados estudos sobre o tema, ainda são, em muitos casos, desconhecidas. Há apenas uma perspectiva e mesmo sob esse ângulo, as consequências são altamente prejudiciais à saúde deles. Além disso, há diversos casos em que os animais passam anos de sua vida suportando dores intensas justamente em razão dos atos humanos de manifestação cultural.
Evidencia-se, portanto, que a manifestação cultural anula totalmente a proteção concedida aos animais, tornando letra morta a norma constitucional. Por outro lado, é possível que, proibindo tal prática, ainda seja possível haver a manifestação e perpetuação da cultura por outros modos. Conclusão inexorável é a de que não podem ser permitidas manifestações culturais que tratem com crueldade quaisquer tipos de animais.
Outrossim, é preciso que se tenha uma perspectiva global da temática. Com base nesse reconhecimento de que os animais gozam de uma Dignidade que lhes é própria, diversos países do mundo aboliram testes em animais, mesmo nos casos em que se pretende proteger, por exemplo, a saúde humana.
É dizer, os animais não são instrumentos de diversão humana ou meios de proteger interesses humanos, mas sim, seres que gozam de alguns dos atributos mais intímos e particulares dos seres humanos, de modo que devem ser protegidos na medida do possível.
c) Calcado nos elementos acima elencados, o STF reconheceu que não é permitida a instrumentalização dos animais em manifestações culturais no território brasileiro.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
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