O princípio da insignificância se aplica aos crimes tributários?
Em caso negativo explique o motivo e em caso positivo, explane sobre os eventuais parâmetros concretos para a aplicação e caracterização do referido princípio.
Sim. No que diz respeito aos crimes contra a ordem tributária, o STJ atualmente entende ser aplicável o princípio da insignificância quando o valor total dos tributos não pagos não ultrapassar o total de R$ 10.000,00.
Não obstante, recentemente o STF alterou sua jurisprudência para elevar esse patamar para R$ 20.000,00, seguindo mudança normativa promovida pela Fazenda na Portaria que baliza o entendimento dos Tribunais.
Cuida-se, tal como já bem ponderou o STJ, de alteração preocupante, eis que não apenas vincula a aplicação da norma penal a uma Portaria do Ministério da Fazenda, que pauta o interesse estatal utilitarista na cobrança de valores fiscais, como também incrementa sobremaneira o valor dos produtos que podem ser inseridos no País sem o devido pagamento dos tributos devidos, como nos casos de descaminho, por exemplo.
Nesse passo, cabe ponderar que os Tribunais Superiores já firmaram jurisprudência no sentido de que o crime de descaminho, embora previsto no Capítulo II do Título XI do Código Penal, é crime equiparado àqueles previstos nos arts. 1o a 3o da Lei 8.137/90, assim como também o são, por exemplo, o excesso de exação e a sonegação de contribuição previdenciária, também previstos no Código Penal.
Gostei da resposta. Trouxe a divergência jurisprudencial. Não tenho certeza se é recomendável adotar uma das teses com tanta veemência se não foi pedido no enunciado.
Sobre o tema:
RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELO PARQUET. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. AFASTAMENTO.
POSSIBILIDADE. VALOR DOS TRIBUTOS ILUDIDOS QUE ULTRAPASSA 20 MIL REAIS. RECURSO PROVIDO.
1. Soa imponderável, contrária à razão e avessa ao senso comum tese jurídica que, apoiada em mera opção de política administrativo-fiscal, movida por interesses estatais conectados à conveniência, à economicidade e à eficiência administrativas, acaba por subordinar o exercício da jurisdição penal à iniciativa da autoridade fazendária. Sobrelevam, assim, as conveniências administrativo-fiscais do Procurador da Fazenda Nacional, que, ao promover o arquivamento, sem baixa na distribuição, dos autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00, determina, mercê da elástica interpretação dada pela jurisprudência dos tribunais superiores, o que a Polícia pode investigar, o que o Ministério Público pode acusar e, o que é mais grave, o que o Judiciário pode julgar.
2. Semelhante esforço interpretativo, a par de materializar, entre os jurisdicionados, tratamento penal desigual e desproporcional se considerada a jurisprudência usualmente aplicável aos autores de crimes contra o patrimônio, consubstancia, na prática, sistemática impunidade de autores de crimes graves, decorrentes de burla ao pagamento de tributos devidos em virtude de importação clandestina de mercadorias, amiúde associada a outras ilicitudes graves (como corrupção, ativa e passiva, e prevaricação) e que importam em considerável prejuízo ao erário e, indiretamente, à coletividade.
3. Sem embargo, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.112.748/TO, rendeu-se ao entendimento firmado no Supremo Tribunal Federal de que incide o princípio da insignificância no crime de descaminho quando o valor do tributo iludido não ultrapassar o montante de R$ 10.000,00, de acordo com o disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002. Ressalva pessoal do relator.
4. A Lei n. 11.457/2007 estabeleceu que os débitos decorrentes de contribuições previdenciárias serão considerados como dívida ativa da União, atribuindo-lhes tratamento semelhante ao dos créditos tributários. Dessa forma, em relação à incidência do princípio da insignificância, os critérios a serem adotados tanto nos delitos de descaminho como nos de apropriação indébita previdenciária serão os mesmos.
5. No caso, como o valor apurado a título de tributos iludidos (R$ 18.078,59), ultrapassa o mínimo previsto na Lei n. 10.522/2002, vigente à época da prática delitiva, é de ser afastada a incidência do princípio da insignificância.
6. Recurso especial provido, para reconhecer a tipicidade material da conduta imputada aos recorridos e, consequentemente, determinar o retorno dos autos ao Juízo de primeiro grau para que prossiga no julgamento do feito.
(REsp 1529964/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 05/11/2015, DJe 23/11/2015)
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA