Encontrando-se em recuperação de uma doença gástrica provocada por um quadro depressivo grave e cumprindo prescrição médica, Aline, dentista, profissional liberal, comprou em um supermercado, para consumir em suas refeições, cereais de aveia produzidos por determinado fabricante. Ao abrir a embalagem e colocar os cereais no prato para consumo, notou, no entanto, que o produto estava infestado de larvas não nocivas à saúde humana e, embora não tenha chegado a ingerir o produto, Aline, devido ao seu estado de saúde física e psicológica, foi acometida por fortes náuseas e repulsa ao alimento, com duração de duas semanas, o que a levou, por recomendação médica, ao repouso e, com isso, ao afastamento do trabalho durante esse período.
Passados treze meses do fato, Aline decidiu ingressar em juízo em desfavor do supermercado, fornecedor direto, e do fabricante do produto, para obter de ambos:
i) compensação por dano moral;
ii) lucros cessantes, visto que ela deixou de lucrar com o atendimento a pacientes durante as duas semanas de afastamento do trabalho.
A contestação do supermercado e a do fabricante do produto fundamentam-se nos seguintes termos:
1 o comerciante defendeu que houve defeito do produto, razão pela qual não deveria responder por eventuais danos verificados, ao passo que o fabricante indicou a ocorrência de vício do produto, o que o eximiria dos supostos danos;
2 ambos os réus afirmam que se operou a decadência, uma vez que Aline demorou mais de um ano para ingressar em juízo, não reclamando previamente do problema;
3 ambos os réus defendem que, não tendo sido ingerido o produto, não ocorreu dano moral.
Ante a situação hipotética apresentada, elabore um texto, devidamente fundamentado na legislação de regência e na jurisprudência. Em seu texto, esclareça os seguintes questionamentos.
1 Houve defeito ou vício do produto?
2 A decadência e a prescrição regulam quais as hipóteses, defeito ou vício do produto?
3 O supermercado fornecedor direto ou comerciante responderá solidariamente caso seja verificado defeito do produto?
4 No caso de vício do produto, haverá responsabilidade solidária entre o fabricante e o fornecedor direto ou comerciante?
5 Foi configurado o dano moral?
6 O supermercado e o fabricante deverão responder por indenização dos lucros cessantes?
1 – Deve-se ressaltar primeiramente que a dicção do CDC, em especial em seu art. 8º, caput é no sentido de que os produtos que forem colocados à disposição dos consumidores irão preservar ao máximo estes consumidores de eventuais riscos à saúde ou sua segurança. No caso concreto estamos diante de um defeito do produto, na medida em que ele não oferece segurança que dele legitimamente se espera. Não há que se falar em eventual vício do produto, portanto.
2 – A decadência regula os vícios do produto (art. 26 do CDC) nos prazos e condições ali estipulados no Código, ao passo que nas hipóteses de reparação de danos por fato do produto, ou defeito, se prescreverá no prazo de 5 anos (art. 27 do CDC).
3 – No caso concreto, tratando-se de fato do produto, ou seja, um defeito, o comerciante, nos termos do art. 13 e respectivos incisos, responderá apenas subsidiariamente quando o fabricante não puder ser identificado, o produto for fornecido sem a devida identificação do fornecedor, ou quando não acondicionar corretamente em seu estabelecimento comercial o produto específico.
4 - No caso de vício do produto, haverá responsabilidade solidária entre o fabricante e o fornecedor direto ou comerciante, nos termos fixados pelo art. 18 e 19 do CDC que fixam que o fornecedor do produto ou serviço irá responder solidariamente com o fabricante pelos vícios do produto ou serviço.
5 – Quanto à configuração do dano moral, embora existam jurisprudências nas cortes superiores, em especial no STJ, em sentido contrário, o fato da autora ter sido exposta ao produto defeituoso, e inapropriado ao consumo, e considerando os efeitos desse contato em sua saúde física, evidente o dano moral caracterizado à saúde e segurança da consumidora.
6 – Ora, tendo sido demonstrado que a autora sofreu danos com a exposição aos alimentos defeituosos e não apropriados para o consumo, e disso tendo sido gerado danos, inclusive impossibilitando a autora de trabalhar, diminuindo sua capacidade, passível a fixação de indenização a título de lucros cessantes, ressarcindo-se também todas as despesas médicas e lucros que a vítima autora deixou de faturar com seu trabalho durante o período de afastamento.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
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