Questão
MP/SP - 89º Concurso para ingresso na carreira do Ministério Público - 2012
Org.: MP/SP - Ministério Público de São Paulo
Disciplina: Direito Penal
Questão N°: 001

clique aqui e responda esta questão
Enunciado Nº 001080

Dissertação:


“HOMICÍDIO CONSUMADO E TENTADO NA CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR: EMBRIAGUEZ E VELOCIDADE EXCESSIVA”


1. Dolo eventual e culpa consciente; 2. Correlação com os delitos do Código de Trânsito Brasileiro; 3. Dolo eventual e tentativa de homicídio; 4. Dolo eventual e qualificadoras do homicídio; 5. Proporcionalidade da pena.


*** Esta questão faz parte de uma prova do mesmo concurso que não foi sorteada para ser aplicada para os candidatos, nos termos do art. 18 § 1º do Regulamento do Concurso. Porém, dada a pertinência da questão para fins de preparação para os concursos, o JusTutor decidiu mantê-la junto à prova original. As questões deste concurso que não estão marcadas com esta observação foram efetivamente aplicadas aos candidatos.

Resposta Nº 005646 por Dudusch


Os crimes de trânsito são consequência da vida em sociedade de risco - ou seja, a condução de veículos automotores importa em risco não só para outros condutores, como também para pedestres e ciclistas, importando, não raras vezes, em fatalidades que vitimam famílias inteiras, em decorrência da inobservância das regras de trânsito.

Um clássico exemplo de imprudência na condução de veículos automotores é a ingestão de álcool ou substância de efeitos análogos antes ou concomitantemente a direção automotivo. São numerosos os exemplos de vítimas fatais em razão da mistura álcool + direção.

Outro famoso exemplo de imprudência na condução de veículos automotores é a direção em velocidades acima do legalmente permitido para a via, maximizando o risco de acidentes, inclusive fatais.

Nessa toada, o Código de Trânsito Brasileiro procurou reprimir condutas delituosas atentatórias às regras de trânsito, estatuindo, nos arts. 302 e 303, respectivamente, os delitos de homicídio culposo e lesão corporal culposa, em decorrência da inobservância de um dever de cuidado objetivo pelos condutores que atuam de forma imprudente, negligente ou imperita, de forma a causarem o resultado naturalístico previsto pelo tipo penal (lesão corporal ou morte dos ofendidos).

Atento a tal panorama e ao elevado número de óbitos no trânsito, o legislador recrudesceu a pena do homicídio culposo quando praticado sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência, prevendo, em seu preceito secundário, pena que varia de cinco a oito anos de reclusão, sem prejuízo da suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão para dirigir veículo automotor (art. 302, § 2º, do CTB, com redação determinada pela Lei nº 13.546/2017). O mesmo fez em relação à lesão corporal culposa de trânsito, conforme disposto no art. 303, § 2º, do CTB, se do crime resultar lesão corporal grave ou gravíssima (a pena é de reclusão de 2 a 5 anos na espécie).

Não obstante, casos há em que o agente causador do resultado naturalístico assum o risco de produzir o resultado, mostrando-se totalmente indiferente ao bem jurídico tutelado (vida) ou alheio as consequências do seu ato, vindo a produzir o resultado descrito no tipo penal.

Neste último caso, o agente deverá responder por homicídio doloso punido a título de dolo eventual (teoria do assentimento ou consentimento), visto que assumiu o risco de produzir o resultado, agindo de forma indiferente a vida alheia.

Normalmente tais casos envolvem a ingestão de álcool ou substância de efeitos análogos mais velocidade excessiva na condução do veículo automotor. No entanto, a análise do elemento subjetivo do tipo penal deve ser causística, de modo a perquirir a intenção do agente através das circunstâncias do caso concreto (ex. condução de caminhão de carga totalmente alcoolizado com o dobro da velocidade superior a máxima permitida são fortes elementos indicadores do dolo eventual).

Neste contexto que se diz que há uma linha fronteiriça entre o dolo eventual (assumir o risco de produzir o resultado = teoria do assentimento/consentimento) e a culpa consciente (previsão do resultado + ausência de consentimento quanto ao resultado).

Com efeito, o agente, na culpa consciente, prevê a ocorrência do resultado naturalístico (morte), mas confia na sua habilidade e persiste na conduta, acreditando que pode evitar a sua ocorrência, não se conformando com a produção do resultado.

Enfim, o elemento anímico ou volitivo que vai dizer se o agente atuou com dolo eventual ou com culpa consciente, demandando uma análise casuística, através da valoração das circunstâncias do caso concreto.

Com relação a incidência de qualificadoras no homicídio de trânsito praticado com dolo eventual, a jurisprudência do STJ firmou entendimento de que há incompatibilidade entre o dolo eventual e a qualificadora do motivo torpe ou fútil (estas de ordem subjetiva), pois não se perquire a motivação do agente para a consecução do resultado naturalístico, eis que o agir é simplesmente impelido pela indiferença ao bem jurídico tutelado de forma genérica (vida). Consigne-se que, no mais das vezes, agente e vítima sequer se conhecem, não se cogitando em motivação fútil ou torpe.

Nesse diapasão e sem prejuízo da análise das circunstâncias do caso concreto, verifica-se inicialmente certa incompatibilidade entre o dolo eventual (ou indireto) e as circunstâncias que qualificam o homicídio simples, delineados no § 2º do art. 121 do Código Penal.

Consigne-se ainda a existência de proporcionalidade entre a pena fixada no preceito secundário do tipo penal (art. 121, "caput", do CP - 6 a 20 anos de reclusão e multa) com o crime de homicídio no trânsito praticado com dolo eventual, pois o agente efetivamente pratica crime contra a vida (submetido ao crivo popular), agindo com indiferença ao bem jurídico mais importante tutelado pelo ordenamento jurídico (a vida é pressuposto do exercício dos demais direitos atribuídos a pessoa).

Por derradeiro, registre-se que nada impede o "conatus" (tentativa) no dolo eventual, porquanto cuida-se de conduta que admite o fracionamento em vários atos (crime plurissubsistente), inexistindo incompatibilidade lógica ou jurídica com a modalidade tentada. 

Outras Respostas deste Enunciado
Clique em cada nome para ver a resposta.

Elaborar Resposta

Veja as respostas já elaboradas para este enunciado

Elabore a sua resposta agora e aumente as chances de aprovação!


Faça seu login ou cadastre-se no site para começar a sua resposta.


É gratuito!


0 Comentários


Seja o primeiro a comentar

Pessoas que mais responderam

01º Jack Bauer
422 respostas
02º MAF
358 respostas
03º Aline Fleury Barreto
224 respostas
04º Sniper
188 respostas
05º Carolina
155 respostas
06º SANCHITOS
127 respostas
07º rsoares
119 respostas
08º amafi
105 respostas
09º Ailton Weller
100 respostas
10º Guilherme
95 respostas
11º Gabriel Henrique
89 respostas
12º Ulisses de Lima Alvim
84 respostas

Ranking Geral

01º Jack Bauer
3374 pts
02º MAF
3086 pts
04º Aline Fleury Barreto
1931 pts
05º SANCHITOS
1403 pts
06º Sniper
1335 pts
07º Carolina
1176 pts
08º Guilherme
1079 pts
09º amafi
998 pts
10º rsoares
920 pts
11º Natalia S H
888 pts
12º Ailton Weller
792 pts
Faça sua busca detalhadamente

QUESTÃO

PEÇA

SENTENÇA

Mostrar Apenas: