Paulo prometeu a João a venda de imóvel urbano não loteado, com direito de arrependimento, mediante o pagamento de 50% do valor do bem a título de entrada e o restante em sessenta parcelas mensais fixas. Com o pagamento da entrada, João foi imitido na posse do imóvel e tomou a providência de efetuar, na matrícula do imóvel, o registro do instrumento particular que materializara a intenção das partes. O ajuste entre os dois vinha sendo normalmente cumprido até que João, em razão de dificuldade financeira superveniente, deixou de pagar as duas últimas parcelas acordadas. Já quando houve atraso do pagamento da primeira delas, Paulo apresentou notificação extrajudicial a João, cientificando-lhe da pronta resilição contratual.
Diante dessa situação hipotética, redija texto dissertativo acerca do acordo entre Paulo e João, com base na legislação e na doutrina relativa aos contratos. Em seu texto, aborde, necessariamente (e, preferencialmente, na ordem estabelecida), os seguintes aspectos:
- possibilidade da resilição contratual desejada por Paulo;
- promessa de compra e venda como espécie de contrato preliminar;
- eficácia obrigacional e eficácia real da promessa de compra e venda no caso em tela;
- princípios da função social dos contratos e da boa-fé objetiva aplicados à situação.
Inicialmente, verifica-se que a promessa de compra e venda firmada entre Paulo e João prevê cláusula de arrependimento, sendo possível, em tese, a resilição unilateral como direito potestativo da parte. A resilição do contrato ocorre por manifestação de vontade das partes. Se for unilateral, só pode ocorrer nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permitir, devendo a parte que quer resilir notificar a parte contrária para tanto (art. 473, CC). A parte que deseja resilir deve pagar uma multa penitencial.
Entretanto, no caso em questão, João cumpriu quase a totalidade do pagamento das parcelas avençadas, sendo certo que, em situações como a descrita acima, os Tribunais Superiores vêm entendendo pela possibilidade de manutenção do contrato, aplicando-se a teoria do adimplemento substancial. A extinção do contrato, aqui, acarretaria um sacrifício desproporcional de João, o que atenta contra a boa-fé objetiva (art. 422, CC) e contra a função social dos contratos (art. 421, CC). Destaque-se, ainda, que a boa-fé objetiva deve ser observada durante as fases pré-contratual, contratual e pós-contratual, valendo, portanto, para o caso de promessa de compra e venda.
A conduta de Paulo, ao querer resilir o contrato, feriu os deveres anexos à boa-fé objetiva, configurando violação positiva do contrato, o que enseja civil responsabilidade aquiliana (art. 187, CC).
Em nome do princípio da conservação dos contratos, a solução para o inadimplemento ocorrido é a cobrança dos valores na via judicial, bem como a possibilidade de negativação do nome do devedor, havendo diversos outros meios coercitivos que não a resolução do contrato, tudo isso em nome da boa-fé objetiva (art. 422, CC) e da função social (art. 421, CC).
No que se refere à promessa de compra e venda, esta é vista como espécie de contrato preliminar, já que contém todos os requisitos essenciais ao contrato, exceto no que diz respeito à forma (art. 462, CC). O contrato preliminar, também chamado de pré-contrato, encerra o acordo entre as partes quanto à celebração posterior de um contrato definitivo.
Antes de registrada a promessa de compra e venda, esta só tem eficácia entre as partes, não sendo oponível contra terceiros. Conforme art. 463, parágrafo único do CC, a promessa de compra e venda deve ser levada a registro e, assim, terá eficácia erga omnes.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
4 de Janeiro de 2020 às 09:09 Renan Guerra Martha Lemos disse: 0
Tirou de ordem o quarto item. E inverteu palavras "civil responsabilidade".