Para que ocorra responsabilidade penal da pessoa jurídica, é necessário o concurso de pessoas?
A responsabilidade criminal da pessoa jurídica tem previsão na Constituição de 1988 (art. 173, § 5º e art. 225, § 3º) e na Lei nº 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais).
Na doutrina, apontam-se duas grandes correntes sobre o tema. Uma defende a responsabilidade penal da pessoa jurídica, tendo como base a Teoria dos Órgãos, de Gierke. A outra a nega, fulcrada na Teoria da Ficção, de Savigny, apesar de grande parte da doutrina civilista adotar a Teoria da Realidade Técnica para explicar a existência da pessoa jurídica.
Para a Teoria dos Órgãos a responsabilidade criminal é cabível. A pessoa jurídica tem capacidade de atuar, possuindo vontade própria, distinta da de seus membros. Não há óbices para que sinta os efeitos da condenação, pois há a aplicação de penas alternativas. A punição deve ficar restrita à pessoa jurídica, não se estendendo à pessoa física, porquanto ambas não poderiam estar incursas no mesmo crime.
Há aqueles que não aceitam ser a pessoa jurídica sujeito ativo de delito, eis que muitos são os obstáculos existentes, não havendo capacidade de conduta, nem de culpabilidade. Assim, tal responsabilidade foge dos princípios básicos do Direito Penal.
A jurisprudência do STJ, em um primeiro momento, adotou a teoria da dupla imputação necessária em crimes contra o meio ambiente, ao fundamento de que a responsabilização penal da pessoa jurídica não poderia prescindir da imputação concomitante da pessoa física que agia em nome da pessoa jurídica (ou em seu benefício). Isso porque somente à pessoa física poderia ser atribuído o elemento volitivo do tipo penal (culpa ou dolo).
Ou seja, a atividade da pessoa física não pode ser dissociada da empresa, pois age em benefício desta, que detém o domínio final do fato. Assim, é possível, na visão mencionada, admitir-se a coautoria (art. 29, CP).
Por sua vez, há quem não conceba o concurso de pessoas na responsabilidade penal do ente coletivo. Com base nesse pensamento, a pessoa física é como órgão da pessoa jurídica, não sendo seu representante.
Na Teoria do Órgão, este possui vontade própria e a exprime, embora tal voluntariedade venha se refletir na esfera jurídica da entidade. Vendo-se a pessoa física como órgão, é ela parte integrante da pessoa coletiva, não a representando, mas sim atuando como se fosse a própria empresa.
Atualmente, não se exige a dupla imputação (concurso de agentes) para responsabilizar-se penalmente a pessoa jurídica, cuja responsabilidade é autônoma e dissociada de seus dirigentes. Houve um overruling na jurisprudência e os Tribunais Superiores passaram a entender que o “art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação. As organizações corporativas complexas da atualidade se caracterizam pela descentralização e distribuição de atribuições e responsabilidades, sendo inerentes, a esta realidade, as dificuldades para imputar o fato ilícito a uma pessoa concreta. Condicionar a aplicação do art. 225, § 3º, da Carta Política a uma concreta imputação também a pessoa física implica indevida restrição da norma constitucional, expressa a intenção do constituinte originário não apenas de ampliar o alcance das sanções penais, mas também de evitar a impunidade pelos crimes ambientais frente às imensas dificuldades de individualização dos responsáveis internamente às corporações, além de reforçar a tutela do bem jurídico ambiental. A identificação dos setores e agentes internos da empresa determinantes da produção do fato ilícito tem relevância e deve ser buscada no caso concreto como forma de esclarecer se esses indivíduos ou órgãos atuaram ou deliberaram no exercício regular de suas atribuições internas à sociedade, e ainda para verificar se a atuação se deu no interesse ou em benefício da entidade coletiva. Tal esclarecimento, relevante para fins de imputar determinado delito à pessoa jurídica, não se confunde, todavia, com subordinar a responsabilização da pessoa jurídica à responsabilização conjunta e cumulativa das pessoas físicas envolvidas. Em não raras oportunidades, as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual”. STF, RE 548181, rel.Min. Rosa Weber, j. 06.08.2013. (Info 714)
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