Sentença
Justiça Estadual
TJ/SP - 188º Concurso para Juiz Substituto - 2019
Sentença Cível

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Enunciado Nº 003972

João X move ação reivindicatória contra Antônio Y, cujo objeto é um prédio rústico de 30 ha, que se acha na posse do réu, e do qual fora proprietário Pedro K, já falecido, pedindo, também, indenização pelos frutos naturais e civis percebidos, desde a invasão, e dos que o forem no curso do processo. Juntou procuração, certidão de óbito de Pedro K, seu testamento público, cujo cumprimento foi devidamente ordenado, certidão de objeto e pé dos autos do inventário e matrícula do imóvel reivindicado, em que Pedro K figura no registro como dele proprietário.

Afirma o autor que é herdeiro testamentário de Pedro K, sendo a sua deixa correspondente a 25% da herança, dentro, portanto, do disponível do testador, que deixou três filhos, os quais divergem entre si, motivo pelo qual foi nomeado inventariante dativo, mas o inventário não terminou. Prossegue dizendo que o réu se encontra na posse de referido imóvel há cerca de quatro anos, sem exibir qualquer título que o legitime, explorando-o economicamente e recusando-se a desocupá-lo.

Citado em 16.4.2018 (segunda-feira), e o mandado cumprido juntado no dia seguinte, o réu contestou em 09.5.2018 (quarta-feira), arguindo em preliminar que o autor, sendo casado, conforme se qualificou na procuração, necessitava de autorização de seu cônjuge para mover essa ação, esclarecendo, igualmente, que ele, réu, é divorciado; além disso, já fora demandado pelo espólio de Pedro K, representado por Roberto K, à época inventariante, em ação de reintegração de posse, julgada improcedente, porque não configurado esbulho, pois o imóvel se encontrava abandonado quando nele adentrou e, sendo idêntica a finalidade de ambas as ações, a pretensão deduzida encontra óbice na coisa julgada, ou, ao menos, o autor sofre os efeitos da eficácia natural daquela sentença; também, atualmente, no inventário, há inventariante dativo a quem toca a representação do espólio, cabendo-lhe promover a intimação dos herdeiros, acerca de ação ajuizada, conforme os artigos 618, I, e 75, § 1o, do CPC, ou seja, a legitimidade é do espólio e não de eventual herdeiro testamentário.

Argui, também, falta de interesse processual, porque, não tendo sido concluído o inventário, ao autor ainda não foi atribuído o imóvel na partilha, devendo, pelo menos, ocorrer a suspensão do processo na forma do artigo 313, V, “a”, do CPC, quando, então, se poderia confirmar a atribuição total ou parcial do imóvel ao autor.

No mérito, o réu suscitou que é possuidor de boa-fé, porque desconhecia obstáculo que o impede de adquirir aquele imóvel encontrado em estado de abandono (art. 1201 do CC), dele não podendo ser desalojado, eis que não cumpria sua função social, tendo, também, o titular perdido a propriedade por abandono, porque naquele estado se encontrava o imóvel havia três anos, entendendo, por isso, não ser injusta a sua posse, e que a procedência da ação reivindicatória exige que o possuidor injustamente detenha a coisa, invocando os artigos 1228 e § 1o, e 1275, III, do CC. Comprovou documentalmente que explora o imóvel com fins econômicos, onde existem árvores frutíferas em parte dele, e a outra parte arrenda, recebendo R$ 500,00 mensalmente, pagos no último dia de cada mês, e que, após a citação, colheu os frutos pendentes, tencionando também colher os que sobrevierem, tanto os naturais como os civis.

Intimado a se manifestar sobre a contestação, o autor juntou certidão de casamento, tendo o matrimônio se realizado seis meses após a esposa viuvar de suas primeiras núpcias, alegou que o primeiro marido tinha vida modesta, não deixando bens, e que a esposa era inexperiente em negócios e não se dispunha a participar de um litígio do qual nenhum proveito lhe adviria, em razão do regime de bens do seu atual casamento. Não se manifestou sobre as consequências legais ou a qualificação jurídica dos demais fatos alegados pelo réu, reconhecendo serem verdadeiros, exceto o abandono do imóvel, porque consta dos bens a serem partilhados, confiando na máxima iura novit curia. Intimado o réu dos novos documentos juntados, nada alegou. As partes desistiram expressamente da produção de outras provas.

É o relatório.

Elabore sentença, enfrentando todos os argumentos das partes, expondo os fundamentos que alicerçarem sua conclusão.

Fica dispensado o relatório.



Resposta Nº 006836 por Otávio Augusto Mantovani Silva


Fundamentação.

I – Preliminares

Considerando todo o exposto, e com base nas provas produzidas no presente processo, pode-se visualizar que trata-se de caso que comporta o julgamento antecipado do mérito nos termos do art. 355, I do CPC.

Acerca das preliminares, todas devem ser REJEITADAS pelos seguintes motivos.

Primeiramente, a alegação do requerido de que o requerente precisaria de autorização expressa da esposa para mover a presente Ação não se sustenta. A outorga uxória ou marital, de fato, nos termos do caput do art. 73 do CPC é requisito necessário para a propositura de demandas que versem sobre Direito Real, como o direito de propriedade.

Entretanto, no presente caso, resta evidente que João e sua esposa estão casados sob o regime da separação absoluta, na medida em que nos termos dos artigos 1523, II, c/c art. 1641, I do CC, no caso de contração de novas núpcias por viúva antes do prazo de 10 meses da morte do cônjuge anterior, não há outro regime possível que não o da separação absoluta. Assim, estando ambos casados sob tal regime, excepciona-se a regra geral da necessidade de outorga uxória nos termos fixados pelo próprio artigo 73 do CPC in fine, REJEITANDO-SE INTEGRALMENTE esta preliminar.

A segunda preliminar suscitada diz respeito à coisa julgada, na medida em que já teria havido decisão acerca do mérito da causa quando do julgamento da demanda possessória.

Observando-se o previsto nos §1º e 4º do art. 337 do CPC, pode-se constatar a coisa julgada quando ajuizada mesma ação repetindo algo que já foi decidido anteriormente por decisão passada em julgada. Ora, no caso concreto não é o que se observa, de forma que não há uma coincidência entre ambas as demandas, que possuem pedidos e causas de pedir diversas. Ademais, o fato de ter sido decidido em ação possessória questão afeta àquela temática em nada afeta a discussão aqui da presente causa quanto à propriedade do bem. Nesse contexto, REJEITO integralmente esta preliminar.

No que diz respeito à ilegitimidade ativa da parte autora, por ser ele mero inventariante dativo, e a ação somente poderia ser movida pelo espólio ou conjunto de herdeiros, também não há fundamento. Observa-se que nos termos da legislação civil, notadamente arts. 1784 e 1791, assim que ocorre o fato morte, a sucessão abre-se de imediato em favor dos herdeiros legítimos e testamentários, sendo a herança, enquanto não cumprido o processo de inventário, indivisível.

Ora, sendo a coisa indivisível até a formal partilha, evidente a caracterização de um condomínio entre os herdeiros, de forma que nos termos do art. 1314 do CC, todos eles podem exercer seu direito de propriedade, em especial o direito de reivindicar a propriedade e posse de determinado bem, como fizera o requerente. ISTO POSTO, REJEITO A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA.

Por fim, no que diz respeito à alegação do requerido de que não estaria preenchido o requisito do interesse processual, na medida em que o inventário seria ação prejudicial à esta demanda cível, também não se sustenta tal alegação.

No caso concreto, diferentemente do alegado pelo requerido, na realidade não é o inventário que é prejudicial à ação reivindicatória, e sim a reivindicatória que é prejudicial ao inventário, tendo aquele que esperar a conclusão deste para prosseguimento.

Observa-se também o não preenchimento da caracterização de dependência da ação reivindicatória do inventário previsto no art. 313, V, a do CPC. Como pontuado, na realidade o inventário que está na dependência desta ação cível reivindicatória, considerando que a decisão aqui deliberada pode afetar a própria divisão do patrimônio em inventário. Assim REJEITO TAMBÉM A PRESENTE PRELIMINAR INTEGRALMENTE.

Rejeitadas todas as preliminares, passa-se à análise do mérito.

II – MÉRITO                 

Quanto ao mérito, a presente ação tem como questão principal a discussão acerca da propriedade do direito de propriedade. De acordo com o art. 1228, “o proprietário tem a faculdade usar, gozar e dispor da coisa e o direito de REAVÊ-LA de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

Assim, considerando o exposto, sendo este um caso de ação reivindicatória, segundo a melhor doutrina e jurisprudência são necessários ao menos a demonstração de 3 requisitos: 1) Demonstração de má-fé do possuidor réu, 2) individualização da propriedade do bem, 3) prova da propriedade pelo autor.

Quanto à posse justa do possuidor, consegue-se observar pelos fatos narrados, que embora quando da invasão do imóvel ele imaginava não haver mais proprietários no local, passado algum período houve ação do legítimo proprietário, no caso Sr. Pedro K, o que tornou a posse do requerido evidentemente clandestina. Ademais, embora não soubesse da invasão, quando tomou conhecimento, conforme consta nos autos, o antigo proprietário tomou as providências para retomar sua propriedade, o que torna incontroversa a clandestinidade da posse do requerido.

Ademais, a mera alegação do requerido de que o imóvel era abandonado, sem a prova devida deste abandono, e considerando ainda o prazo de apenas três anos desde a desocupação do imóvel, não parece razoável para fins de declarar ou considerar perdida a posse do autor. Nestes termos, deve haver devolução da terra ao status quo ante.

Além deste aspecto do direito material, no presente caso não se consegue visualizar o cumprimento do réu de seu dever quanto ao ônus da prova, de provar existência de fato impeditivo ou modificativo do direito do autor (art. 373, II, do CPC), pesando, portanto, em face do requerente as consequências do ônus. Ainda que houvesse prova de abandono das terras pelo requerente, em nada impactaria ou beneficiaria a posse ou eventual pedido de propriedade do requerido (não se preenchendo qualquer hipótese para Usucapião).

Por fim, quanto ao pedido de indenização pelos frutos, o alegou e demonstrou nos autos que explora o imóvel com fins econômicos e já colheu diversos frutos naturais e civis, recebendo inclusive R$ 500,00 reais por mês. Quanto aos frutos reza o art. 1214 do CC/02 “O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar”

Ora, se fora proposta ação reivindicatória em 09.05.18, a partir desta data, consegue-se verificar que nos termos do art. 1202 do CC o possuidor não poderia mais ignorar obstáculos à aquisição da coisa, de forma que, conciliando a aplicação dos dois artigos (art. 1214 e 1202) o possuidor terá direito aos frutos percebidos até a citação, de forma que a partir desta data.

Por outro lado, quanto aos frutos pendentes, nos termos do parágrafo único do art. 1214 o requerente tem o direito de ser indenizado, depois de deduzidas as despesas de produção e custeio, também tendo direito à indenização quanto aos frutos colhidos por antecipação. Vale observar que conforme reza o art. 1215 os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que separados, e os industriais ou civis assim que percebidos dia por dia.

DISIPOSITIVO

Isto Posto, com base em todo o alegado, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente demanda, com base no art. 487, I do CPC para resolver o mérito e fixar o seguinte:

1) que seja restituída a posse ao legítimo proprietário em face da ocupação do imóvel, garantindo-se devidamente sua propriedade, devendo o requerido DESOCUPAR o imóvel voluntariamente no prazo de 15 dias, sob pena de multa diária de R$ 500,00 reais até a devida desocupação;

2) que seja indenizado o requerente indenizado quanto aos frutos pendentes e os colhidos por antecipação a partir da data de 09.05.18 (data da citação do requerido).

Os valores da indenização dos frutos deverão ser corrigidos monetariamente ao índice de preços IGP-M. Fixo por fim juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, todos que deverão ser calculados quando da liquidação.

Por fim, havendo sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das despesas processuais e honorários de sucumbência, fixando-os em 10% sob o valor da causa nos termos do art. 85, §2º e 86 do CPC devendo o requerido pagar 70% e o requerente 30% do total.

 

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