Sentença

Sentença 03938

Justiça Federal
TRF/5 - XII Concurso para Juiz Federal Substituto do TRF da 5ª Região - 2012
Sentença Penal

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FIM

Enunciado Nº 003938

Em 2002 e 2003, a pessoa jurídica S.A.M. Revenda de Veículos Ltda., sediada em Recife – PE, efetuou movimentações financeiras em valores muito superiores aos informados à Secretaria da Receita Federal. Em 2004, tais fatos foram comunicados ao Ministério Público Federal (MPF) pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF). Paralelamente, foi protocolizada na Procuradoria da República, em Pernambuco, uma notícia crime assinada por ex-empregado da empresa, noticiando que ela era utilizada como meio para lavagem de dinheiro, tendo sido anexados documentos indicativos da veracidade da acusação.

O MPF instaurou procedimento investigatório criminal, no qual oficiou à Junta Comercial do Estado de Pernambuco, requisitando cópia do contrato social da pessoa jurídica, bem como das respectivas alterações. Remetido o contrato social originário, que, firmado em 20/4/2001, não sofrera qualquer alteração, foram identificados os sócios da empresa: Samuel Nogueira (sócio-gerente), Antônio Simão e Manuel Oliveira (sócios cotistas).

O procurador da República responsável pela condução do procedimento enviou correspondências aos sócios da empresa, solicitando que comparecessem à sede da Procuradoria da República em Recife para prestarem esclarecimentos. Os sócios compareceram e, acompanhados de advogados, prestaram depoimentos. Foram esclarecidos os seguintes fatos: Antônio Simão e Manuel Oliveira não eram verdadeiramente sócios, mas, apenas, empregados, exercendo exclusivamente a atividade de vendedor de veículos, não tendo qualquer participação na gestão nem nos resultados da empresa; ambos sequer sabiam que figuravam como sócios da empresa, tendo apenas, ante a promessa de emprego feita por antigo colega (Samuel Nogueira), assinado alguns papéis em branco; Samuel Nogueira, identificado como sócio-gerente tanto nos atos constitutivos da empresa quanto em seus cadastros fiscais, funcionava como testa de ferro do real proprietário, Rosalvo Valverde, prefeito do município de Rio Vermelho – PB.

Ainda no procedimento investigatório, o procurador da República expediu ofício à Secretaria da Fazenda e ao DETRAN do estado de Pernambuco, solicitando informações sobre notas fiscais expedidas pela empresa e transferências de veículos realizadas diretamente por ela ou por qualquer de seus sócios na época dos fatos. A documentação enviada ao MPF ratificou que os negócios realizados oficialmente pela empresa seriam insuficientes para gerar faturamento correspondente às movimentações financeiras realizadas em suas contas bancárias nos anos de 2002 e 2003.

Já no âmbito da Procuradoria Regional da República na 5.ª Região, para onde os autos foram encaminhados após surgimento de indícios do envolvimento de prefeito, descobriu-se, a partir de documentos requisitados à prefeitura de Rio Vermelho – PB, que Rosalvo Valverde se apropriara de recursos federais repassados ao município, em 2002, em razão de convênio celebrado com o Ministério da Saúde, o qual teve como objeto a aquisição de duas UTIs móveis que seriam destinadas a postos de saúde situados em localidades com altíssimo índice de mortalidade. Apurou-se, ainda, que os veículos jamais foram entregues, tendo sido o valor do convênio integralmente transferido para uma das contas bancárias da pessoa jurídica S.A.M. Revenda de Veículos Ltda., a pretexto de pagar pelos veículos, mas com o real propósito de desvincular o numerário de sua origem ilícita. As condutas causaram à União um prejuízo de R$ 180.000,00.

Ao término do procedimento administrativo criminal, o MPF encaminhou cópia dos autos à Receita Federal em Pernambuco, a fim de que fosse instaurado processo administrativo fiscal. Em junho de 2007, foi definitivamente constituído o crédito tributário de R$ 150.000,00, correspondente ao imposto de renda (pessoa jurídica) incidente sobre os valores objeto de movimentações financeiras “a descoberto” em 2002, tendo sido aplicado pelo fisco o disposto no art. 42 da Lei n.º 9.430/1996. Ficou pendente de julgamento o recurso administrativo interposto pela S.A.M. Revenda de Veículos Ltda. quanto ao auto de infração referente ao exercício de 2003.

Em 10/8/2007, a Procuradoria Regional da República na 5.ª Região ofereceu denúncia contra Rosalvo Valverde, Samuel Nogueira, Antônio Simão e Manuel Oliveira, imputando-lhes a prática das seguintes condutas, em concurso material e de pessoas: um crime de falsidade ideológica, tendo por objeto o contrato social (CP, art. 299); dois crimes contra a ordem tributária (Lei n.º 8.137/1991, art. 1.º, I e II), um em relação a cada exercício financeiro (2002 e 2003); um crime de quadrilha ou bando (CP, art. 288). Em relação aos denunciados Rosalvo Valverde e Samuel Nogueira, também foi postulada a condenação por crimes de peculato (CP, art. 312) e lavagem de dinheiro (Lei n.º 9.613/1998, art. 1.º, V), em razão da apropriação de recursos públicos e seu depósito em instituição financeira com o propósito de ocultar-lhe a origem ilícita.

O desembargador federal relator determinou a notificação dos denunciados para apresentarem resposta no prazo de quinze dias, conforme art. 4.º da Lei n.º 8.038/1990. Após a apresentação das respostas preliminares, a denúncia foi integralmente recebida pelo Pleno do TRF da 5.ª Região em 16/7/2008. Citados os denunciados, o relator interrogou os réus, os quais apresentaram defesas prévias. O relator delegou a instrução do feito a juízes federais dos locais de residência das testemunhas arroladas pelas partes, o que foi feito mediante expedição de cartas de ordem.

A oitiva das testemunhas foi encerrada em dezembro de 2008. Em janeiro de 2009, o relator determinou a remessa dos autos ao juízo de primeira instância em face do encerramento do segundo mandato de prefeito do réu com prerrogativa de foro.

Recebidos os autos pela Vara Federal Criminal de Recife, determinou-se a intimação das partes para requererem o que de direito, inclusive diligências probatórias. Somente o réu Samuel Nogueira requereu a realização de perícia nos documentos para comprovar a inexistência de falsidade ideológica no contrato social, pleito ainda pendente de apreciação. Facultados aos réus novos interrogatórios, ninguém declarou interesse em ser novamente ouvido.

As partes foram intimadas para apresentarem memoriais em cinco dias, conforme disposto no art. 403, § 3.º, do CPP, com redação dada pela Lei n.º 11.719/2008.

Em razões finais, o MPF alegou que: a) os fatos descritos na denúncia foram provados, inclusive mediante confissão de Antônio Simão e Manuel Oliveira, os quais declararam, em seus interrogatórios, não serem verdadeiramente sócios da S.A.M. Revenda de Veículos Ltda.; b) a simples circunstância de Antônio Simão e Manuel Oliveira terem assinado documentos em branco, independentemente da intenção de colaborarem na prática de crimes ou de obterem qualquer proveito econômico ou jurídico, os tornaria coautores do crime de quadrilha; c) a instrução processual corroborava as provas colhidas na fase pré-processual, devendo ser a denúncia julgada totalmente procedente; d) a inexistência de constituição definitiva do crédito tributário de imposto de renda referente ao ano-calendário de 2003 não seria impedimento para a instauração de processo penal nem condenação por crime material contra a ordem tributária, haja vista a independência entre as instâncias administrativa e penal; e) as penas a serem aplicadas ao ex-prefeito Rosalvo Valverde deveriam ser majoradas por ele responder a cinco inquéritos policiais por desvio de recursos públicos e, especificamente quanto ao crime de peculato, porque as verbas apropriadas se destinavam à aquisição de bens que atenderiam necessidades essenciais de pessoas carentes; f) o art. 387, IV, do CPP, com redação dada pela Lei n.º 11.719/2008, deveria ser aplicado, por ser norma impositiva e de caráter processual, a todos os processos ainda não sentenciados.

Rosalvo Valverde, em alegações finais, sustentou: a) a prevalência do foro por prerrogativa de função, mesmo após a cessação do mandato; b) a incompetência absoluta da justiça federal em Pernambuco para o julgamento do crime de desvio de recursos públicos, que se teria consumado no município de Rio Vermelho S PB; c) a nulidade do processo por inobservância dos artigos 396 e 396-A do CPP, não suprida pela notificação prevista no art. 4.º da Lei n.º 8.038/1990, que é anterior à citação; d) a nulidade do processo, porquanto as provas acostadas à denúncia foram colhidas diretamente pelo MPF; e) a impossibilidade de sua responsabilização pelos crimes contra a ordem tributária, tendo em vista que, embora responsável de fato pela administração da empresa, seu nome não constava no contrato social, muito menos como sócio-gerente; f) a inexistência de crime de peculato, em razão de a prestação de contas do convênio ter sido aprovada pelo Ministério da Saúde; g) a subsunção da conduta tipificada pelo MPF como peculato ao crime descrito no art. 1.º, I, do Decreto-lei n.º 201/1967, não previsto como crime antecedente na redação originária do art. 1.º da Lei n.º 9.613/1998, razão por que não seria cabível a condenação por crime de lavagem de dinheiro; h) o impedimento, pelo princípio da não culpabilidade, de que seja sopesada em seu desfavor a mera existência de inquéritos policiais em que figure como investigado.

Ao apresentar razões finais, Samuel Nogueira aduziu que: a) todo manancial probatório carreado aos autos seria ilícito, visto que derivado de informação sigilosa (dados sobre movimentações financeiras) obtida pelo COAF, sem autorização judicial; b) estaria havendo cerceamento de defesa, já que não fora realizada perícia nos documentos, procedimento imprescindível à comprovação da falsidade ideológica do contrato social; c) não poderia ser acusado do crime de peculato visto que não era funcionário público, condição que jamais ostentara; d) não lhe caberia, como réu, provar que os depósitos realizados nas contas bancárias da pessoa jurídica da qual era sócio-gerente não eram rendas ou proventos passíveis de tributação pelo respectivo imposto cobrado da pessoa jurídica, cabendo ao MPF demonstrar o contrário; e) os depósitos bancários não seriam fatos geradores de imposto de renda; f) a presunção do art. 42 da Lei n.º 9.430/1996 (de que os valores depositados em instituições financeiras e não declarados constituiriam receitas ou rendimentos omitidos) teria eficácia restrita ao âmbito tributário, não podendo ser aplicada no direito penal; g) a falsidade ideológica seria absorvida pelo delito contra a ordem tributária; h) seria descabida a aplicação do art. 387, IV, do CPP, com redação dada pela Lei n.º 11.719/2008, visto que o MPF não formulara pedido nesse sentido nem houvera contraditório sobre o valor dos danos causados pelas supostas infrações.

Antônio Simão e Manuel Oliveira, representados pelo mesmo advogado, apresentaram alegações finais conjuntamente, nos seguintes termos: a) ausência de dolo, tendo em vista que, como evidenciado desde o início das investigações, não tinham conhecimento que estavam firmando um contrato social, tendo apenas assinado alguns papéis em branco a pedido de um antigo conhecido, o réu Samuel Nogueira, que lhes prometera emprego; b) inexistência de crime de quadrilha ou bando, porquanto jamais tiveram a intenção de cometer crimes.


Em face dos fatos acima relatados, redija a sentença, dando solução ao caso. Analise toda a matéria de direito pertinente para o julgamento e fundamente suas explanações. Dispense relatório e ementa, e não crie fatos novos.

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