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6 de Março de 2017 Decisões
Liminar - Ex-vocalista do IRON MAIDEN - Autorização para realização de show - Artista Estrangeiro sem visto de trabalho

Decisão liminar autorizando a realização de apresentação musical de artista estrangeiro, ex-integrante do Iron Maiden, que, equivocadamente, não obteve prévio visto de trabalho.


Decisão proferida em Plantão Judiciário, horas antes da realização do show.


A decisão é um pouco antiga, mas o assunto é interessante.


Obs: A decisão foi proferida antes da entrada em vigor das novas regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

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Mandado de Segurança

Impetrantes: Paul Martin Andrews e Outro

Impetrado: Polícia Federal em Uberlândia



R.h., em regime de plantão.


DECISÃO


Trata-se de mandado de segurança preventivo interposto por Paul Martin Andrews e Marcos Freire de Oliveira contra ato da Polícia Federal de Uberlândia/MG, na qual o impetrante requer autorização para apresentação musical de Paul Martin Andrews no estabelecimento denominado London Pub. Sustentam os impetrantes que Paul foi procurado por agentes da Polícia Federal e informalmente comunicado que estaria impedido de realizar sua apresentação no referido estabelecimento, pois seu visto de turista não permitiria a realização de atividade remunerada no Brasil. Alega que não realiza atividade remunerada, pois a arrecadação resultante da venda dos ingressos seria revertida para os músicos da cidade, os quais estão recebendo o apoio do impetrante Paul Martin Andrews. Prosseguem os impetrantes argumentando que o cancelamento da apresentação ocasionaria tumulto na porta do local, fato que colocaria em risco a segurança das pessoas que aguardam a realização do evento.


Breve relatório. Passo a decidir.


A Lei nº 6815/80, em seu art. 98, é clara ao afirmar que o estrangeiro com visto de turista não pode exercer qualquer atividade remunerada no Brasil.


Diz o seguinte o referido art. 98 da Lei nº 6.815/80:


“Art. 98. Ao estrangeiro que se encontra no Brasil ao amparo de visto de turista, de trânsito ou temporário de que trata o artigo 13, item IV, bem como aos dependentes de titulares de quaisquer vistos temporários é vedado o exercício de atividade remunerada. Ao titular de visto temporário de que trata o artigo 13, item VI, é vedado o exercício de atividade remunerada por fonte brasileira. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)” (grifei)


A pena para o estrangeiro que descumprir a determinação contida no supra-referido art. 98 da Lei nº 6.815/80 é a deportação, por força do disposto no art. 125, VIII, do mencionado diploma legal, in verbis:

Art. 125. Constitui infração, sujeitando o infrator às penas aqui cominadas:

(...)

VIII - infringir o disposto nos artigos 21, § 2º, 24, 98, 104, §§ 1º ou 2º e 105:

Pena: deportação.


Não há dúvida que todos devem obedecer às leis brasileiras, inclusive os estrangeiros que por aqui se encontrem, como no caso do impetrante Paul Martin Andrews.


Mas qual o objetivo da proibição de realização de atividade remunerada pelos estrangeiros portadores de visto de turista? Ao que tudo indica, a proibição de realização de atividade remunerada, no caso do turista, tem como objetivo a proteção do mercado de trabalho dos nacionais, pois o visto de turista, certamente, é mais fácil de ser obtido do que um visto de trabalho.


Contudo, o caso retratado nos autos é singular, uma vez que o impetrante Paul Martin Andrews é ex-integrante do grupo musical Iron Maiden, uma dos mais importantes grupos musicais de toda a história do heavy metal, formado em 1975 e, portanto, com mais de três décadas de existência. O impetrante Paul Martin Andrews, conhecido no meio artístico como Paul Di’Anno, foi o primeiro vocalista do Iron Maiden, sendo substituído por Bruce Dickinson na década de 80.


Desta forma, a apresentação musical do impetrante Paul Di’Anno na cidade, em um único dia (hoje), não ocasionaria qualquer risco ao mercado de trabalho dos nacionais residentes em Uberlândia. Pelo contrário, estimularia a produção musical e artística local, em razão de seu notório prestígio no meio musical internacional.


Assim, considerando que “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”, conforme preceitua o art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, entendo que não seria razoável impedir a apresentação do impetrante Paulo Martin Andrews (Paul Di’Anno) em Uberlândia, pois este não é o fim social almejado pelo art. 98 da Lei nº 6.815/80.


Além disso, pelo que foi narrado na petição inicial, percebe-se que não houve má-fé do impetrante na obtenção do visto de turista, e sim equivocada interpretação da legislação que rege o ingresso, permanência e atividades de estrangeiros no Brasil, pois entendeu o impetrante que sendo o valor dos ingressos supostamente revertidos para os músicos que o acompanham, tal fato não representaria atividade remunerada.


Por outro lado, conforme informações constantes nos autos, já foram vendidos todos os ingressos para a apresentação desta noite, sendo que o cancelamento do evento, faltando apenas algumas horas para seu início, ao certo causaria considerável tumulto no local, colocando em risco a segurança de centenas de pessoas que aguardam a apresentação musical do impetrante no estabelecimento London Pub, localizado na Avenida Floriano Peixoto, no centro da cidade de Uberlândia.


Assim, em atenção ao princípio da segurança previsto no art. 5º, caput, da Constituição Federal de 1988, não seria razoável o cancelamento da apresentação do impetrante na cidade neste momento.


Ante o exposto, DEFIRO A LIMINAR determinando que a Polícia Federal se abstenha de impedir a realização da apresentação musical do impetrante Paul Martin Andrews, conhecido artisticamente pelo nome de Paul Di’Anno, no estabelecimento London Pub, evento este programado para ter início na noite de hoje (21/11/2007), com término na madrugada do dia 22/11/2007.


Notifique-se, com urgência, a Polícia Federal para que cumpra a presente decisão.


Ressalto que a presente decisão não impede posterior apuração administrativa de infração à Lei nº 6.815/80 pelo impetrante, bem como não alcança posteriores apresentações do impetrante Paul Martin Andrews em outros locais.


Uberlândia/MG, 21 de dezembro de 2006.


GUSTAVO SORATTO ULIANO

Juiz Federal Substituto

em regime de plantão (22 horas e 03 minutos)

Autor: Juiz Federal Gustavo Soratto Uliano.
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