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11 de Abril de 2016 Artigos jurídicos · Processo Penal
A contagem do prazo prescricional quando aplicada a suspensão do art. 366 do CPP

Em caso de suspensão do processo e do prazo prescricional, na forma do art. 366 do Código de Processo Penal, questão polêmica é a relativa ao tempo de duração da suspensão da prescrição, já que, ressalvadas as exceções previstas nos incisos XLII (racismo) e XLIV (ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático) do art. 5º da Constituição Federal, não há crimes imprescritíveis em nossa legislação.

A maior parte da jurisprudência e da doutrina sempre defendeu o entendimento de que a suspensão do prazo prescricional prevista no art. 366 do CPP deveria corresponder ao prazo da prescrição da pretensão punitiva, ou seja, da prescrição em abstrato, considerando-se o máximo da pena aplicável ao delito atribuído ao réu e as balizas estabelecidas nos incisos do art. 109 do CPB.

Além de, na prática, evitar a imprescritibilidade dos delitos, esse entendimento prestigia o princípio da proporcionalidade, pois o prazo de prescrição ficaria suspenso por mais ou por menos tempo, de acordo com a maior ou menor gravidade do delito. De fato, um mesmo prazo de suspensão da prescrição para todas as infrações penais violaria, flagrantemente, o princípio da proporcionalidade.

Não obstante, no julgamento da Extradição 1042 (Pleno, j. 19/12/06), o STF adotou entendimento diverso, defendendo a posição de que a contagem da prescrição poderia ficar suspensa por tempo indeterminado, ou seja, ficaria suspensa enquanto o processo também ficasse. No julgamento do RE 460.971/RS, a 1ª Turma da Suprema Corte, reiterando o entendimento do Plenário, estabeleceu que:

"Citação por edital e revelia: suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, por tempo indeterminado - C.Pr.Penal, art. 366, com a redação da L. 9.271/96.

1. Conforme assentou o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ext. 1042, 19/12/06, Pertence, a Constituição Federal não proíbe a suspensão da prescrição, por prazo indeterminado, na hipótese do art. 366 do C. Pr. Penal.

2. A indeterminação do prazo da suspensão não constitui, a rigor, hipótese de imprescritibilidade: não impede a retomada do curso da prescrição, apenas a condiciona a um evento futuro e incerto, situação substancialmente diversa da imprescritibilidade.

3. Ademais, a Constituição Federal se limita, no art. 5º, XLII e XLIV, a excluir os crimes que enumera da incidência material das regras da prescrição, sem proibir, em tese, que a legislação ordinária criasse outras hipóteses.

4. Não cabe, nem mesmo sujeitar o período de suspensão de que trata o art. 366 do C.Pr.Penal ao tempo da prescrição em abstrato, pois, "do contrário, o que se teria, nessa hipótese, seria uma causa de interrupção, e não de suspensão."

5. RE provido, para excluir o limite temporal imposto à suspensão do curso da prescrição". (RE 460.971/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, j. 13.02.2007, v.u.)

Adotando, porém, o entendimento majoritário, o STJ editou, na sessão do dia 16/12/09, a Súmula 415, com o seguinte enunciado:

"O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada".

O que a Súmula 415 determina é que a contagem da prescrição fica suspensa pelo prazo da prescrição em abstrato – consideradas as balizas do art. 109 do CP – e não pelo prazo da pena máxima cominada ao delito. Dessarte, se o delito tem pena máxima cominada de 4 anos – como no nosso exemplo –, a prescrição em abstrato se dá em 8 anos (art. 109, IV do CP) e a contagem da prescrição, portanto, ficará suspensa por esses 8 anos e não por 4 anos, que é o prazo da pena máxima cominada ao crime.

Essa é a correta interpretação da Súmula 415, conforme se verifica pelos precedentes que a originaram, como, v. g.:

"Consoante orientação pacificada nesta Corte, o prazo máximo de suspensão do prazo prescricional, na hipótese do art. 366 do CPP, não pode ultrapassar aquele previsto no art. 109 do Código Penal, considerada a pena máxima cominada ao delito denunciado, sob pena de ter-se como permanente o sobrestamento, tornando imprescritível a infração penal apurada". (STJ, HC 84.982/SP, rel. Min. Jorge Mussi, j. 21/2/2008)

Assim, o entendimento agora consubstanciado na Súmula 415 do STJ parece ser mais acertado. Equivocado, por consequência, s. m. j., o pensamento do Supremo, não se sustentando os argumentos de que a Constituição Federal não proíbe a suspensão da prescrição por prazo indeterminado e não impede o legislador ordinário de estabelecer outras hipóteses de crimes imprescritíveis além das já previstas em seu Texto (art. 5º, XLII e XLIV).

É que qualquer espécie de suspensão no Direito, como é o caso da suspensão política de direitos, sempre deverá estar condicionada a evento futuro e certo, portanto, sempre se dá dentro de prazo limitado no tempo. A suspensão da prescrição no CPB, por exemplo, só subsiste enquanto não é resolvida questão prejudicial em outro processo, ou enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro, ou ainda enquanto o condenado está preso por outro motivo (art. 116, I e II e parágrafo único do CP). De igual modo, a suspensão de direitos políticos por condenação transitada em julgado só subsiste "enquanto durarem seus efeitos" (art. 15, III, da CF).

Portanto, a suspensão tem sempre termo final definido (ainda que não exato), condicionado ao implemento de uma condição certa. E foi exatamente o que fez o STJ com a edição da Súmula 415 do STJ: como o art. 366 do CPP dispõe sobre a "suspensão" da contagem do prazo prescricional, mas não prevê seu termo ad quem, o STJ, com apoio no entendimento doutrinário majoritário, estabeleceu esse termo final, que se dará com o advento dos prazos estabelecidos no art. 109 do CP.

A suspensão da contagem prescricional condicionada a um evento incerto – o comparecimento do acusado ao processo –, na prática, implica em tornar indefinido o final do prazo de suspensão da prescrição, tornando o delito, ao menos em tese, imprescritível.

Lado outro, parece certo que a Constituição estabeleceu de forma taxativa as hipóteses de imprescritibilidade aos crimes de racismo e aos casos de ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático, exatamente para proibir a imprescritibilidade em qualquer outro delito, ressalvada a dos delitos contra a humanidade, nos termos do direito universal emanado da ONU. Não faria sentido, por exemplo, afirmar que o legislador ordinário pode tornar imprescritível um delito de desacato ou de furto.

Conforme a consagrada lição de Carlos Maximiliano Pereira dos Santos, as normas restritivas de direitos fundamentais devem sempre ser interpretadas restritivamente, para restringir ao mínimo o direito posto, e é desse modo que se deve interpretado o artigo 5º da Constituição. Com efeito, se esse dispositivo constitucional estabeleceu apenas duas hipóteses de imprescritibilidade, deve-se entender que outras não são permitidas.

Autor: Carlos Fernando Araújo de Azevedo; Alexandre Henry Alves
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