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No texto anterior, eu comecei a falar das provas subjetivas, aquelas em que você tem que elaborar um texto como resposta, e disse que o primeiro e maior segredo para sair bem nessa fase do concurso é praticar. Praticar muito! Mas, há também outras dicas que, se você ainda não conhece, merecem a sua atenção.
Peguemos a dissertação do XIII
Concurso para Juiz Federal Substituto do TRF da 5ª Região como exemplo para
clarear os ensinamentos que eu quero passar. Constava na prova:
Disserte sobre o tema controle de
constitucionalidade, abordando, necessariamente, os aspectos a seguir.
- No
que se refere ao controle preventivo de constitucionalidade de lei federal pelo
Judiciário, considere os seguintes pontos: controle concreto ou abstrato;
legitimados ativos e passivos; a(s) hipótese(s) de cabimento; meio(s)
viável(is) para a realização de tal controle; e os efeitos da decisão.
- Com relação ao controle abstrato de
constitucionalidade de lei municipal, considere os seguintes pontos:
possibilidade e hipóteses de controle; normas-parâmetro; corte(s) competente(s)
para a realização de tal controle em cada hipótese; legitimados à propositura da
ação abstrata em cada hipótese; efeitos da decisão em cada hipótese.
- Ainda no que tange ao controle abstrato de
constitucionalidade de lei municipal, considere o cabimento ou não de recurso extraordinário
em face de acórdão do tribunal local que declarar a inconstitucionalidade de lei municipal.
O primeiro passo é ler a questão ao menos duas vezes.
Pode parecer uma sugestão boba, mas tem gente que passa os olhos pelo enunciado
e já sai respondendo, especialmente quando percebe que domina bem uma parte do
que é exigido. O risco é você se esquecer de algo ou não compreender, em sua
totalidade, o que o examinador quer.
O seu objetivo, nessas duas
leituras iniciais do enunciado, é justamente identificar a forma e o conteúdo
da questão, ou seja, o que o examinador quer que você aborde e a forma como ele
quer que você o faça. Nesse nosso exemplo, é possível identificar, desde logo,
que ele quer que você faça uma dissertação,
que é um texto por meio do qual você vai expor as suas ideias acerca de
determinado(s) tema(s). Se você elaborar sua resposta sob um formato diferente
de uma dissertação, poderá perder pontos preciosos ou mesmo ver sua nota
zerada.
Além de constatar que o
examinador deseja que você disserte, a leitura do enunciado também permite
saber que ele quer que você aborde todos os aspectos que ele citou sobre o
controle de constitucionalidade. Repare que ele coloca a palavra necessariamente:
Disserte sobre o tema controle de
constitucionalidade, abordando, necessariamente,
os aspectos a seguir.
Portanto, você não deve se
esquecer de nenhum dos itens. Como não se esquecer deles? No nosso exemplo,
está bem fácil, pois o examinador os colocou de forma clara e expressa. Ao
longo da redação de sua dissertação, você pode simplesmente ir ticando cada
item do enunciado, o que evitará terminar seu texto sem abordar tudo. Mas, pode
ser que o enunciado não esteja tão evidente quanto aos pontos exigidos ou, no
caso de questões, quanto ao problema central que o examinador quer que você
enfrente. Aí, a sugestão é você sublinhar as palavras mais importantes ou fazer
um esquema na folha de rascunhos. Tomemos como exemplo uma questão do mesmo
concurso do TRF da 5ª Região:
Ao detectar uma movimentação de R$5.000.000
na conta bancária de José, a
Receita Federal do Brasil instaurou ação fiscal contra ele, e, após
processamento regular, constituiu
definitivamente crédito tributário no valor de R$1.500.000 a título de
imposto de renda de pessoa física.
Devidamente comunicado via representação
fiscal para fins penais, o Ministério Público Federal instaurou investigação
criminal e, após diversas diligências, descobriu que José não era o verdadeiro titular
do numerário que transitou por sua conta, o qual pertencia a João, a quem José "emprestou" sua conta,
entregando-lhe cartão de movimentação, senha e cheques assinados em branco.
Denunciados
José e João pela prática
prevista no artigo 1.º, I, da Lei n.º 8.137/1990, este último apresentou
resposta à acusação (CPP - 396-A), na qual alegou que não seria possível
instaurar, contra si, ação penal por crime fiscal, já que não se operou em seu desfavor o necessário lançamento fiscal,
de modo a não o alcançar, obviamente, o lançamento decorrente de processo
administrativo do qual não participou.
************
Na condição de juiz, realize o juízo de admissibilidade,
considerando somente a situação hipotética descrita.
Nessa questão, depois de ler o
enunciado duas vezes, você saberia que o examinador desejava que você fizesse
um juízo de admissibilidade da denúncia criminal, ou seja, que você dissesse se
a ação penal proposta pelo Ministério Público poderia ter continuidade ou não.
As palavras e expressões que eu destaquei ajudam você a perceber o que o
examinador quer e qual é o cerne do problema. Em formato de esquema, seria mais
ou menos assim:
1) A Receita Federal constitui
crédito tributário, de forma definitiva, contra José.
2) O MPF descobre que o
dinheiro, que deu origem à cobrança do imposto, pertencia na verdade a João.
3) O MPF denuncia os dois por
crime de sonegação fiscal.
4) João se defende dizendo que
ele não fez parte do processo administrativo tributário e, por isso, não há
crédito tributário definitivamente constituído contra ele, o que seria uma
condição de admissibilidade da ação penal.
5) Pergunta a ser respondida:
quem não foi parte do processo administrativo de constituição de um crédito
tributário X pode responder por ação penal por crime de sonegação fiscal referente
a esse crédito tributário X ou é necessário que, antes, ele também tenha a
oportunidade de se defender administrativamente? Obs.: não se esquecer de analisar, também, a admissibilidade da denúncia contra José.
Veja que, no formato de
esquema que coloquei acima, eu já fui mais além do que fiz no exercício de
sublinhar as palavras e expressões mais importantes da questão. Eu identifiquei
exatamente o que o examinador quer que eu responda. Essa é a pedra angular na construção de
qualquer texto de dissertação ou resposta de questão discursiva! E, em regra, é
o maior erro dos candidatos. A maioria dos estudantes comete um desses dois
erros:
1. NÃO ENTENDE O QUE O EXAMINADOR QUER
2. NÃO ABORDA TUDO O QUE O EXAMINADOR QUER
Nessa questão do crime de
sonegação fiscal, o candidato poderia fazer uma bela resposta e levar uma nota próxima
do zero. Como? Ele poderia tecer considerações gerais sobre os crimes de sonegação
fiscal, falar da discussão jurídica acerca da necessidade de constituição
definitiva ou não do crédito tributário como condição da ação penal, pontuar o
que se considera constituição definitiva e dizer o que os tribunais decidiram
sobre o tema, ou seja, se a constituição definitiva é ou não condição prévia
para o processamento da ação penal. Uma resposta em português perfeito, com um
texto claro e coerente. Mas, e a dúvida do examinador? Ele até gostaria de ver
você abordando esses pontos, mas ele quer mesmo é saber se pode ser admitida a
denúncia criminal contra João, mesmo não tendo João sido colocado no polo
passivo do lançamento tributário. E, claro, se pode ser admitida a denúncia contra José (eu coloquei a observação após a pergunta, no item 5, para me lembrar de que era preciso abordar também esse ponto, sob pena da resposta ficar incompleta). Sem responder a essas questões, especialmente a primeira, todo o resto
desmorona. Lembre-se mais uma vez: identificar o que o examinador deseja saber,
em sua integralidade, é a pedra
angular de uma prova discursiva.
A solução para não cometer esses
tropeços passa por: a) praticar muita dissertação e responder a muitas questões
discursivas antes do concurso, pois só assim você se acostumará a identificar
rapidamente o que o examinador quer; b) ler o enunciado com calma e ao menos
duas vezes; c) destacar as palavras mais importantes ou montar um esquema na
folha de rascunhos; d) tentar redigir, no caso de perguntas (e também no caso
de algumas dissertações), uma frase que sintetize o que o examinador deseja
saber, tal como eu fiz no item 5 do esquema sobre a questão do TRF da 5ª
Região. Faça isso e metade do caminho já terá sido percorrido, acredite em mim.
Vamos parar por aqui, por
enquanto. No próximo texto, eu continuo falando sobre provas discursivas.
Alexandre
Henry
Professor e Juiz Federal
P.S.: caso você tenha Twitter, publico algumas coisas por lá. Perfil: https://twitter.com/henryprosa
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