Sentença
Justiça Federal
TRF/3 - XVI Concurso para Juiz Federal Substituto - 2012
Sentença Cível

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Enunciado Nº 002384

Considerando os dados a seguir fornecidos como relatório da sentença, elabore sua fundamentação e dispositivo, apreciando e decidindo as questões apresentadas e os pedidos deduzidos.



Foi aberta licitação na modalidade concorrência pela União Federal, tendo por objeto os serviços de limpeza e conservação dos prédios pertencentes ao Ministério da Previdência e Assistência Social no Estado de São Paulo.


A empresa TODAOBRA EMPREENDIMENTOS LTDA., não possuindo certificado de registro cadastral, foi considerada inabilitada pela Comissão de Licitação por não ter apresentado documentos capazes de demonstrar sua capacidade técnica; por não ter comprovado a realização de serviços similares e por não ter exibido as CNDs (Certidões Negativas de Débitos), conforme exigido no edital. Assim, propôs ação de conhecimento contra a União Federal, aduzindo que:


- dentre a documentação exigida no edital de licitação referente à capacitação técnico­ profissional, é indevida a apresentação de atestado fornecido por pessoas jurídicas devidamente registradas nas entidades profissionais competentes em nome da empresa, quando são apresentados os atestados em nome dos seus profissionais empregados. Alega, ainda, que essa exigência é incabível para o caso e desproporcional ao objeto da licitação e à proposta apresentada, pois há demonstração de sua aptidão com os documentos apresentados.

- é ilegal a exigência de comprovação de realização de ao menos dois serviços similares, na mesma proporção do objeto da licitação, nos últimos três anos, pois além de não ser dado imprescindível a demonstrar a sua capacidade operacional, fere o princípio da isonomia entre os licitantes.

- é indevida a prova de regularidade fiscal através da exibição de CNDs (Certidões Negativas de Débitos) no tocante às dívidas de tributos federais, estaduais e municipais, pois a licitação ocorre com ente federal. Ademais, a prova de regularidade fiscal fere a Constituição, ao limitar a atividade da empresa e por constituir meio indireto de cobrança dos tributos;


Além disso, alegou:


- ser inconstitucional o inciso III do parágrafo 2° do artigo 3° da Lei 8.666/93, pelo qual "em igualdade de condições, como critério de desempate, será assegurada preferência, sucessivamente, aos bens e serviços produzidos ou prestados por empresas brasileiras".

- ser ilegal a limitação prevista no edital da garantia de 5% do valor do contrato, prestada por meio de caução em dinheiro ou fiança bancária, ferindo o parágrafo 1º do artigo 56 da Lei 8.666/93.

- ser ilegal o item do edital que dispõe sobre a impossibilidade de revisão do futuro contrato administrativo, caso ocorra aumento de salário proveniente de dissídio coletivo dos trabalhadores, em afronta ao inciso II do artigo 65 da Lei 8.666/93;


Nesse sentido, formulou pedidos visando:


1 - o afastamento de itens ilegais e inconstitucionais existentes no edital da referida licitação, quais sejam:

a) a exigência de atestado de capacidade técnico-profissional em nome da empresa;

b) a exigência de comprovação da realização de ao menos dois serviços similares, na mesma proporção do objeto da licitação, nos últimos três anos;

c) a exigência de CNDs (Certidões Negativas de Débitos);

d) inconstitucionalidade do inciso III do parágrafo 2° do artigo 3º da Lei 8.666/93;

e) a limitação das garantias;

t) a impossibilidade de revisão do futuro contrato administrativo, nos termos do inciso II do artigo 65 da Lei 8.666/93, caso ocorra aumento de salário proveniente de dissídio coletivo dos trabalhadores;

2 - a sua habilitação para o prosseguimento no referido certame, com a abertura do envelope contendo sua proposta; OU

3 - caso não seja acolhido esse pedido, a anulação de todo o procedimento com a abertura de nova licitação e a publicação de novo edital, sem os vícios ilegais e inconstitucionais acima apontados;

4 - pleiteia, ainda, a condenação da União Federal em danos morais, no montante de R$200.000,00 (duzentos mil reais), decorrentes da sua indevida inabilitação, por ter sofrido prejuízos à sua imagem;

5 - condenação nas verbas de sucumbência.


Nos termos do artigo 273 do CPC, requereu a antecipação dos efeitos da tutela para que fosse determinada a suspensão da licitação, sem a abertura dos envelopes contendo as propostas ou, que fosse considerada a sua habilitação e inclusão nas demais etapas do procedimento, ou ainda, que fosse suspensa a homologação do resultado final do certame. Atribuiu à causa o valor de R$200.000,00 (duzentos mil reais) e protestou pela produção de todas as provas admitidas em direito.


Postergada a apreciação do pedido de tutela para após o decurso do prazo de resposta, a União Federal foi citada e em sua peça de contestação aduziu:


Preliminarmente:


- a extinção do processo por litispendência, considerando a propositura de mandado de segurança pela referida empresa contra o Presidente da Comissão de Licitação, no qual questiona a indevida exigência de Certidões Negativas de Débitos, e cujo pedido é de suspensão do mesmo procedimento licitatório;

- a falta de interesse processual, uma vez que as questões atinentes às ilegalidades ou inconstitucionalidades do edital de licitação não podem mais ser discutidas pela empresa neste momento, seja pela preclusão lógica, pois já concordara participar da licitação aceitando todos os termos do edital, seja pela preclusão temporal ao deixar transcorrer o prazo de cinco dias úteis antes da abertura dos envelopes para impugná-lo;

- a falta de interesse processual quanto aos demais itens que não ensejaram sua inabilitação no certame; e

- a impugnação ao valor da causa, pois o montante atribuído refere-se apenas aos pretendidos danos morais.


No mérito, aduziu:


- que a exigência da demonstração de capacidade técnico-profissional, a comprovação de realização do objeto anteriormente, a apresentação de certidões negativas de débitos, o critério de desempate, as opções de garantias e a impossibilidade de revisão do contrato decorrem expressamente da lei e da Constituição;

- que a CND (Certidão Negativa de Débitos) referente aos tributos federais também não pode ser considerada, pois foi apresentada em cópia simples; e

- que não cabe dano moral em relação à pessoa jurídica.


Após a apresentação da contestação, a empresa PISOLIMPO LTDA. pediu ingresso no processo como assistente litisconsorcial ou simples, na medida em que foi habilitada para participar da fase de abertura das propostas. Em relação ao mérito, defendeu a exclusão da autora da licitação, e corroborou os argumentos da União.


Instadas a se manifestarem sobre o pedido de intervenção, a autora não concordou com o ingresso do terceiro e a União não se manifestou.


Ainda, após intimada, a autora apresentou réplica à contestação, defendendo seu interesse processual, pois a propositura do mandado de segurança não impediria o julgamento da ação de conhecimento, ainda que com pedido parcialmente parecido, reiterando todos os argumentos aduzidos na inicial.


Não existindo irregularidades a sanar, intimadas as partes a especificarem provas, a autora requereu o julgamento antecipado do feito e a União permaneceu inerte, tendo a Secretaria certificado o decurso do prazo, fazendo os autos conclusos para o Magistrado SENTENCIAR.

Resposta Nº 000654 por Felipe G Camargo Media: 6.00 de 1 Avaliação


Relatados, fundamento e decido.

 

Como as partes não manifestaram qualquer interesse na produção de provas e as questões discutidas são unicamente de direito, passo ao julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 330, I, do Código de Processo Civil (CPC).

 

Admito a intervenção da empresa PISOLIMPO LTDA como assistente simples, com fundamento no art. 50 do CPC, pois presente o seu legítimo interesse jurídico no julgamento favorável à ré, na medida em que eventual procedência da demanda traria reflexos em sua posição jurídica como concorrente já habilitada na licitação promovida pela ré. Se a autora, como resultado desta ação, também for habilitada no procedimento licitatório, há possibilidade de que sua proposta seja melhor do que a da interveniente, o que tornaria esta vencida no certame. Não é caso de assistência litisconsorcial porque não há relação jurídica entre a interveniente e a autora (art. 54 do CPC).

 

Não conheço da impugnação ao valor da causa porque veiculada no bojo na contestação, quando deveria ter sido formulada em apartado, nos exatos termos do art. 261 do CPC.

 

Acolho a alegacão de litispendência no tocante ao pedido de afastamento da exigência editalícia das certidões negativas de débitos tributários, por se tratar de repetição de demanda objeto do mandado de segurança impetrado pela autora em face da autoridade responsável pela licitação, integrante da pessoa jurídica ré. Presente, portanto, a hipótese do art. 301, §§ 2º e 3º, do CPC, ainda que não haja exata identidade quanto aos pedidos — ordem de suspensão do certame, na ação mandamental, e habilitação ou anulação da concorrência, nesta ação. É que a questão discutida é uma só e ambos os provimentos levariam a efeitos práticos coincidentes, gerando evidente risco de decisões conflitantes. Denego, por conseguinte, o exame do mérito em relação à questão litispendente, com fundamento no art. 267, V, do CPC, prosseguindo-se o julgamento apenas quanto aos demais pedidos formulados na inicial.

 

Rejeito a preliminar de falta de interesse na impugnação do edital licitatório, pois a necessidade de acionar o Judiciário surge também no momento em que a concorrente se vê juridicamente prejudicada com a sua exclusão da concorrência pública em razão da concreta aplicação das regras inscritas no edital. A impugnação do edital na via administrativa não é condição da ação e sua ausência não importa concordância com eventuais regras reputadas ilegais ou inconstitucionais, de modo que não haveria assim qualquer preclusão. Ademais, a garantia constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5º, XXXV, da Constituição) não permite sequer à lei excluir da apreciação judicial lesão ou ameaça de lesão a direitos.

 

Rejeito, outrossim, a preliminar de falta de interesse na impugnação das regras que não serviram de fundamento para a inabilitação da autora na concorrência, eis que sempre haverá interesse de agir em juízo diante de normas que em tese possam vir a lesar direitos invocados por concorrentes, em qualquer fase do curso do procedimento licitatório, na adjudicação do seu objeto e nos próprios termos de eventual contrato administrativo. A propósito, há previsão legal expressa de que todos os participantes da licitação possuem direito público subjetivo à fiel observância da legalidade do procedimento (art. 4º, caput, da Lei nº 8.666/1993). 

 

Resolvidas as questões prévias, passo ao exame do mérito.

 

A exigência de atestado de capacidade técnica em nome da empresa concorrente decorre de lei (art. 30, II, da Lei nº 8.666/1993), pois a qualificação técnica abrange tanto a capacidade técnico-operacional da empresa quanto a capacidade técnico-profissional do seu quadro de pessoal. Com efeito, ao contrário do sustentado pela autora, a documentação apenas em nome dos profissionais da empresa atestam somente a aptidão do quadro de pessoal, mas não demonstra a aptidão operacional da empresa. Tal exigência não se mostra, portanto, descabida ou desproporcional, na medida em que a execução do objeto licitado depende não apenas de mão-de-obra qualificada, mas de condições estruturais da própria empresa que viabilizem a regular prestação do serviço por seus profissionais.

 

A comprovação de experiência na realização do objeto licitado tampouco ofende a legalidade ou o princípio da isonomia. Como a Administração Pública deve ter a segurança necessária de que o objeto do contrato será executado a contento, é razoável que o edital delimite o âmbito de concorrentes a empresas que efetivamente demonstrem ter capacidade técnico-operacional para tanto, nos termos do art. 30, II, da Lei nº 8.666/1993.

 

Improcede, portanto, o pedido de habilitação da autora.

 

Passo ao exame dos fundamentos invocados para o pedido sucessivo de anulação de todo o procedimento.

 

A autora suscita a realização de controle incidental de constitucionalidade de norma que estabelece preferência nacional. A despeito de a suscitante não invocar qualquer paradigma para o controle invocado, o exercício da jurisdição constitucional não pode ser desprezado pelo julgador na análise dos atos normativos aplicáveis ao caso concreto. As preferências instituídas pelo legislador, como critério de desempate, aos bens ou serviços produzidos ou prestados por empresas brasileiras (art. 3°, § 2º, III, da Lei 8.666/93), não violam qualquer preceito constitucional, apenas concretizam um dos objetivos fundamentais da República: garantir o desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da Constituição). Rejeita-se, portanto, a alegação de inconstitucionalidade.

 

No tocante à limitação prevista no edital da garantia de 5% do valor do contrato, prestada por meio ou de caução em dinheiro ou de fiança bancária, razão assiste à autora. De fato, ao se excluir a opção de que o contratado ofereça como modalidade de garantia o seguro-garantia, viola-se previsão expressa do art. 56, § 1º, II, da Lei 8.666/93. 

 

O vício no instrumento convocatório macula todo o procedimento, impondo-se a anulação do certame. O legislador conferiu à Administração Pública margem de discricionariedade para exigir ou não a prestação de garantias nas contratações públicas. A exigência de garantia, contudo, deve ser especificada no edital e atender à norma veiculada no art. 56, § 1º, da lei mencionada. O legislador não conferiu ao administrador público a opção de excluir quaisquer das modalidades de garantia. Com efeito, não há outra forma de convalidar o vício, devendo ser expedindo novo edital, reiniciando-se todo o procedimento. Reitero que a higidez do certame é de ordem e interesse públicos, sujeitando-se o procedimento a controle social (art. 4º, caput, da Lei nº 8.666/1993).

 

Por fim, quanto à impossibilidade de revisão do futuro contrato administrativo, caso ocorra aumento de salário proveniente de dissídio coletivo dos trabalhadores, não se verifica ofensa ao disposto no art. 65, II, da Lei 8.666/93, pois a norma trata de justamente de hipóteses de alteração consensual do contrato e aumento dos custos de mão-de-obra não caracteriza álea extraordinária a justificar recomposição do equilíbrio econômico-financeiro. A mera previsão de cláusula contratual excluindo revisões em decorrência de aumentos salariais apenas reforça a necessidade de que os interessados no objeto licitado prevejam tais ocorrências antes de formular suas propostas. De todo modo, no caso concreto o contratante sempre poderá recorrer ao Judiciário caso entenda haver abusividade das cláusulas pactuadas.

 

Ante todo o exposto, de rigor o acolhimento do pedido de anulação do procedimento licitatório diante da ilegalidade do seu edital ao não prever a modalidade do seguro-garantia como opção para a garantia que o contratado deve oferecer.

 

Passo a examinar o pedido de reparação de danos morais.

 

A autora pede a condenação da União no valor de R$ 200 mil, em razão dos danos morais decorrentes da sua indevida inabilitação, por ter sofrido prejuízos à sua imagem. O pedido improcede porque a inabilitação não foi indevida, como acima exposto. 

 

Isso posto, acolho a alegação de litispendência e JULGO EXTINTO O PROCESSO, sem resolução de mérito, apenas no tocante ao pedido de afastamento da exigência editalícia das certidões negativas de débitos tributários, com fundamento no art. 267, V, do Código de Processo Civil. Quanto aos demais objetos, ACOLHO EM PARTE os pedidos apenas para anular o edital da Concorrência Pública referida na ação e todos os atos subsequentes do procedimento licitatório, devendo a autoridade licitante expedir novo edital com previsão expressa de todas as opções de de garantia previstas no art. art. 56, § 1º, da Lei 8.666/93, notadamente a modalidade de seguro-garantia.

 

Presentes os requisitos do art. 273, I, do CPC, seja a verossimilhança do direito invocado, diante do próprio exaurimento da cognição nesta instância, seja o receio de dano fundado pelo evidente risco de desfazimento de atos adjudicatórios decorrentes do certame, antecipo parte dos efeitos da tutela concedida para o fim de obstar o prosseguimento da licitação. 

 

Sem condenação em honorários advocatícios, ante a sucumbência recíproca das partes (art. 21, caput, do CPC), respondendo a autora pela metade das custas processuais, isenta a União, repondendo sua assistente (PISO LIMPO LTDA) pela outra metade (art. 32 do CPC).

 

P.R.I.

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