Questão
TJ/SC - Concurso para ingresso na carreira da Magistratura - 2017
Org.: TJ/SC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Disciplina: Direito Empresarial e Econômico
Questão N°: 002

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Enunciado Nº 003156

MASTER COMPUTADORES LTDA., tem JOSÉ como sócio gerente e representante legal da empresa, casado pelo regime da comunhão de bens com MARIA, quotista minoritária da empresa MASTER. Esta empresa celebra com o BANCO FENERATÍSCIO diversos contratos de empréstimo para injeção de recursos, como capital de giro, recebíveis de cartão de crédito etc., consolidados que foram, após diversas renegociações destinadas à repactuação do débito global, em uma cédula de crédito bancário única, com saldo renegociado a ser satisfeito em diversas parcelas, garantida pela alienação fiduciária de imóvel já pertencente à empresa MASTER e à MARIA, em frações de 65% e 35%, respectivamente, de natureza mista, pois utilizado no andar superior para moradia familiar e, no térreo, como sede do estabelecimento comercial da empresa MASTER. Consta no ajuste MARIA como fiadora e avalista de notas promissórias emitidas em favor do BANCO, tendo sido, ademais, cumpridas as formalidades legais inerentes ao início do negócio.

Satisfeitas algumas parcelas da dívida mas, considerando a crise econômica do país, que reduziu drasticamente as suas receitas ordinárias, a pessoa jurídica deixa de pagar diversas prestações.

O BANCO FENERATÍSCIO intenta, então, procedimento para reaver o bem. Solicita ao Ofício Imobiliário a expedição, contra os devedores, de intimações que, atendida a legislação quanto aos seus demais requisitos, foram enviadas por correspondência com aviso de recebimento e endereçadas ao imóvel, no qual são recebidas, no balcão de atendimento do estabelecimento, por MARIA, que se identifica como sócia da empresa e apõe nos escritos sua firma mas, distraída, olvida os avisos na gaveta do balcão.

Tempos depois, devedora e garantes recebem novas notificações, também por carta com AR, sobre a data de leilões próximos designados para fins da venda do imóvel, pelo que, receosos de perder a moradia e o local de trabalho, JOSÉ e MARIA consultam advogado especializado.

Neste ínterim e, objetivando evitar a perda do bem, MASTER efetua o trespasse do estabelecimento, incluindo estoques, máquinas e utensílios, para JOTA CAMINHÕES S/A, mediante contrato particular de promessa, assinado por ambos os representantes legais, com firmas reconhecidas no Tabelionato, e arquivado na sede das empresas; e MARIA vende suas quotas na MASTER para CASTRO, representante comercial, deixando a sociedade.

Considerando o enunciado acima, responda fundamentadamente:

1. Uma vez tratar-se de repactuação de contratos de empréstimo, conclui-se haver desvio de finalidade na constituição da garantia imobiliária para a cédula de crédito bancário, não destinada ao financiamento para a aquisição do imóvel?

2. Na cédula de crédito bancário é viável a presença de cláusula resolutória, expressa ou tácita, com a consolidação da propriedade ao credor decorrente do vencimento da dívida? Justifique. De acordo com o caso narrado, foram atendidos os requisitos legais do procedimento? Justifique.

3. Caso vendido o bem em leilão, restará aos devedores algum direito? Caso os devedores ou eventual locatário se recusem à desocupação, qual a alternativa cabível ao credor fiduciário ou ao arrematante do imóvel em leilão?

4. Judicialmente, MASTER poderá alegar a sua ilegitimidade ad causam ou acionar JOTA CAMINHÕES S/A como a responsável pelas obrigações contratuais perante o BANCO, face o trespasse? E a transferência das quotas sociais para CASTRO exonera MARIA das obrigações frente ao BANCO?

5. Restando uma nota promissória impaga e sendo levada a protesto, com a avalista MARIA sendo negativada, responda, justificadamente:

a. Caso queira receber quitação da dívida, como MARIA deverá efetuar o pagamento e, caso feito, de quem é a responsabilidade pelo levantamento da negativação e em qual prazo?

b. Se porventura considerados indevidos o protesto e a consequente negativação, MARIA terá direito à indenização caso já possuísse outra negativação, porém, válida, ao tempo dessa irregular?

c. Caso o BANCO endosse a nota promissória em preto, com cláusula ‘não a ordem’, após o vencimento e o prazo para protesto, para terceira empresa ‘A’, e esta também a endosse para ‘B’, que cobra mas não

recebe de MARIA o valor literal estampado na cártula, ‘B’ poderá exercer o direito de regresso contra ‘A’ e o BANCO, na condição de endossantes?

Resposta Nº 006295 por Arthur


1. Não há desvio de finalidade na prática sob análise. Conforme entendimento já pacificado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o instrumento da alienação fiduciária não se presta apenas à própria aquisição do bem. Ao contrário, portanto, entendeu o STJ pela possibilidade da alienação fiduciária de bem já de titularidade do alienante fiduciário, com vistas a fornecimento de garantia em contrato com objeto outro, comumente sendo, justamente, a tomada de dinheiro em empréstimo (mútuo), tal qual se dá no presente caso.

2. A regulamentação da cláusula referente à consolidação da propriedade em nome do credor tem lugar na Lei nº 9.514/97, que disciplina os contratos de alienação fiduciária, não havendo óbice à sua aplicação pelo simples fato de tal negócio jurídico ser acessório garantidor de cédula de crédito bancário. Assim sendo, tendo em vista o teor do contido no art. 26 do supracitado diploma, é possível afirmar a validade da cláusula resolutória que consolida a propriedade no nome do credor. Para tanto, porém, a lei em comento exige a observância de uma série de requisitos. Em primeiro lugar, o art. 26, §§1º e 3º, afirma a necessidade de que o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído, seja intimado, pessoalmente ou por correio (com aviso de recebimento), da sua mora, a fim de, querendo, pagar a dívida no prazo de 15 dias. Considerando que, no caso apresentado, a intimação se deu de maneira devida por correio com A.R., a discussão potencial gira em torno dos poderes que Maria tinha para receber essa intimação ou se esta apenas poderia ter sido recebida por José, uma vez que ele era o representante da sociedade empresária. Não obstante essa questão já ter sido alvo de longo debate, atualmente encontra-se pacificado na jurisprudência, em que pese a existência de algumas decisões ainda hoje dissonantes, o entendimento de que, em se tratando de intimação por correio, o porteiro ou outra pessoa responsável pelo recebimento das correspondências é pessoa apta a receber a intimação, satisfazendo a exigência legal. Assim, Maria, sendo sócia da empresa, e assim se apresentando, tendo recebido a intimação no setor de atendimento ao público, se amolda ao entendimento jurisprudencial consolidado, não havendo nesse ponto qualquer vício a merecer reparo.

3. O art. 27, §2º-B, Lei nº 9.514/97, prevê que, mesmo após a consolidação da propriedade e até a data do segundo leilão, é assegurado ao devedor fiduciante o direito de preferência na reaquisição do imóvel. Porém, a jurisprudência tem entendido pela possibilidade da aplicação, igualmente, do art. 902, CPC, de modo que aos devedores, mesmo após a venda em leilão, desde que antes da assinatura do auto de arrematação, será assegurado o direito de preferência para reaver o bem, nos termos da lei da alienação fiduciária. Já no que tange à negativa de desocupação, a Lei nº 9.514/97 prevê em seu art. 27, §7º, que eventual locação existente poderá ser denunciada pelo fiduciário, concedendo-se prazo de 30 dias para desocupação. Em caso de não atendimento desse comando pelos locatários ou mesmo pelos devedores fiduciantes, o art. 30 do diploma legal em comento prevê ao credor fiduciário, seus sucessores ou cessionários, ou também ao adquirente do imóvel alienado fiduciariamente, o direito de reintegração de posse, sendo essa, portanto, a ação adequada, sobretudo considerando que o credor fiduciário tinha a posse indireta (desdobrada) sobre a coisa, a qual transfere ao adquirente, justificando-se assim falar em reintegração da posse.

4. Tanto MASTER quanto MARIA não lograrão êxito na tentativa de se exonerar de suas responsabilidades. Aquela, pois o art. 1.146 é claro ao dispor que o alienante do estabelecimento permanece responsável pelas dívidas preexistentes pelo prazo de um ano. E esta, com base em semelhante argumento, porém, pelo prazo de dois anos, em conformidade com o art. 1.003, parágrafo único do CC.

5. a. Maria deverá efetuar o pagamento diretamente ao beneficiário da nota promissória, no caso, o Banco, devendo dele exigir a entrega do título, como forma de prova da quitação. O mesmo Banco, na condição de credor, será o responsável por levantar a negativação no prazo de 5 dias úteis.

5. b. Conforme entendimento sumulado do STJ, em caso de protesto e negativação indevida contra pessoa já negativada de maneira válida, fica afastada a ocorrência de dano moral e consequentemente o dever de indenizar, pois o nome daquela pessoa já se encontrava na base de dados dos devedores, não tendo havido alteração no seu status de bom ou mau pagador pelo protesto indevido.

5. c. "B" poderá exercer direito de regresso apenas contra "A" de quem recebeu o título em endosso, conforme previsão do art. 15 da Lei Uniforme de Genebra (LUG). Contra o Banco, "B" não disporá do direito de regresso, pois esse, ao endossar o título a "A" com cláusula não à ordem, modificou a natureza do título, impossibilitando futura transferência por endosso, nos termos do art. 11 da LUG, razão pela qual o endosso posteriormente feito de "A" a "B" não gera a sua responsabilização.

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