À época das eleições de 2016 para o cargo de prefeito municipal, contra determinado cidadão foi proferida condenação à suspensão de direitos políticos, em processo de ação civil pública por improbidade administrativa, mediante acórdão unânime, no qual se reconheceu a prática de ato doloso pelo referido cidadão, com lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito.
Considerando a situação hipotética apresentada, redija um texto que atenda às determinações a seguir.
1 Exponha, de forma fundamentada, em que consiste o registro de candidatura e quais são os requisitos para esse registro.
2 Explicite qual é o fato jurídico decorrente do enunciado da questão e explique, à luz da jurisprudência do TSE e da legislação eleitoral, se há alguma providência judicial cabível, se o referido fato ocorrer após o registro da candidatura do cidadão.
3 Esclareça fundamentadamente se existe providência judicial a ser tomada caso tal condenação sobrevenha antes do registro
da candidatura do cidadão.
O registro de candidatura é um procedimento administrativo que tem lugar no bojo do processo eleitoral, amplamente considerado, isto é, a abarcar desde as primeiras atividades com vistas às eleições, como por exemplo, as convenções partidárias, encerrando-se com a diplomação dos candidatos eleitos. Esse procedimento de registro, em que pese a natureza administrativa, se realiza junto à Justiça Eleitoral, conforme regulamentação trazida pelo Código Eleitoral (Lei nº 4.737/65 - art. 47 e seguintes) e pela Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97 - art. 10 e seguintes).
Com relação aos requisitos, apresentam-se, basicamente, em dois grandes grupos: as condições de elegibilidade, previstas no art. 14, §3º, da Constituição Federal (CF), cuja presença deverá ser auferida (requisito positivo); e as causas de inelegibilidade, com previsão no mesmo artigo, nos parágrafos 4º a 9º, que devem estar ausentes (requisito negativo, portanto).
Conforme, portanto, previsão expressa da CF, as condições de elegibilidade são: a) nacionalidade brasileira; b) pleno exercício dos direitos políticos; c) alistamento eleitoral; d) domicílio eleitoral na circunscrição; e) filiação partidária; e f) idade mínima de acordo com o cargo pretendido.
Já as causas de inelegibilidade são variadas e algumas têm assento consitucional, enquanto outras são previstas em lei complementar, em consonância com a redação do art. 14, §9º, CF. Na própria CF encontra-se, em primeiro lugar, as chamadas inelegibilidades absolutas, as quais dizem respeito aos analfabeto e aos inalistáveis, que são, de acordo com o §2º do supracitado artigo, os estrangeiros e os conscritos (durante o serviço militar obrigatório). Para além dessa previsão, há referência, também, à inelegibilidade decorrente do cargo ocupado pelo candidato (art. 14, §6º, CF) ou pelo parentesco com outro detentor de mandato eletivo (art. 14, §7º, CF). Por fim, há a que se considerar as previsões do art. 1º da Lei Complementar nº 64/1990, que prevê um extenso rol de hipóteses de inelegibilidade, uma das quais, exatamente, idêntica à situação narrada no enunciado, ou seja, condenação por ato doloso de improbidade administrativa (art. 1º, I, "l", LC 64/90).
Portanto, o fato jurídico em tela narrado é uma causa de inelegibilidade, cuja consequência prática em relação ao candidato vai variar de acordo com o momento do processo eleitoral em que ela vier a se caracterizar: antes ou depois do registro da candidatura.
No caso de se verificar previamente ao deferimento do registro, essa inelegibilidade pode ser suscitada pela via da ação de impugnação ao registro de candidatura (AIRC), a qual judicializa o procedimento referente ao pedido de registro e é disciplinada pelo art. 3º da LC nº 64/90. Decorrido o prazo legalmente previsto pelo dispositivo em tela, haveria a preclusão temporal em relação ao momento adequado para a alegação da inelegibilidade, de modo que, não se constatando ser ela, no caso concreto, de índole constitucional, não haveria mais como pretender impugnar o direito do candidato a concorrer naquelas eleições.
Em se tratando, por outro lado, de inelegibilidade a surgir supervenientemente ao deferimento do registro, por consectário lógico não será mais possível o manejo da AIRC, mas o Código Eleitoral prevê, em seu art. 262, a possibilidade da utilização do Recurso Contra a Expedição do Diploma (RCED). Recentemente, porém, alteração legislativa promovida pela Lei nº 13.877/2019 desconfigurou o instituto da inelegibilidade superveniente, uma vez que se alterou a redação do §2º do retrocitado artigo, que passou a definir como superveniente a inelegibilidade surgida até a data final para requerimento de registro, momento em que, em verdade, não há que se falar em "superveniência", pois ainda possível o uso da AIRC, não havendo necessidade (e, portanto, interesse de agir) no ajuizamento de RCED. Desse modo, atualmente, em caso de inelegibilidade reconhecida após o registro de candidatura, não haveria providência judicial cabível a ser tomada pelos interessados. Vale, por fim, dizer que, dado o caráter verdadeiramente recente da alteração legal, não há ainda resposta dos Tribunais acerca dessa questão, mas já se fazendo ouvir a irresignação da doutrina especializada no ramo eleitoral.
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