Daniel, de 25 anos de idade, solteiro e desempregado, conduzia automóvel de propriedade de Carla, de 42 anos de idade, solteira e servidora pública, quando atropelou Pedro, de 10 anos de idade, que morreu no local do acidente. Os pais da vítima, Marcos e Diana, ambos com 30 anos de idade e casados, ajuizaram, em desfavor de Daniel e de Carla, ação de reparação por danos causados ao filho do casal.
Os autores da ação alegaram que: (i) a causa do acidente foi a conduta imprudente de Daniel, que dirigia em alta velocidade na via quando atropelou Pedro, que faleceu em decorrência da colisão, conforme laudo anexado aos autos; (ii) Daniel não parou o veículo para prestar socorro à vítima, como comprova um arquivo de vídeo anexado aos autos; (iii) o réu não tinha carteira de habilitação e, mesmo assim, Carla emprestou o veículo para ele conduzi-lo. Por essas razões, requereram a condenação de ambos ao pagamento de danos morais e de pensão mensal.
Em defesa, o réu alegou que: (i) o atropelamento se deu por negligência dos pais do menino, já que o acidente só aconteceu porque Pedro tentou atravessar a rua enquanto brincava sozinho e desvigiado em frente de sua casa; (ii) inexistia nos autos prova pericial que constatasse a velocidade excessiva do veículo que ele dirigia. Concluiu, então, que os pedidos autorais deveriam ser julgados totalmente improcedentes, em razão da culpa exclusiva dos pais da criança, autores da ação, ou que a indenização fosse fixada considerando-se a culpa concorrente dos pais.
Por sua vez, a ré alegou sua ilegitimidade passiva, sob o fundamento de que não havia nexo de causalidade entre a sua conduta de emprestar o veículo e a morte do menor, mesmo que ela soubesse que Daniel não possuía habilitação, e que o atropelamento ocorreu por culpa exclusiva dos pais do menino. Ao final, pediu a sua exclusão da lide e a improcedência do pedido, em razão da culpa exclusiva apontada, e, subsidiariamente, que a fixação dos danos considerasse a culpa concorrente dos pais.
Os réus não arrolaram testemunhas. A testemunha arrolada pelos autores declarou que Pedro brincava com outra criança e, ao atravessar a rua para buscar uma bola, foi atropelado por um veículo em alta velocidade, não tendo o motorista parado para prestar socorro à vitima. Afirmou, ainda, que a rua era tranquila e que era habitual a presença de crianças brincando nas calçadas.
O laudo da perícia realizada no veículo atestou que houve colisão entre o automóvel e um corpo flácido, possivelmente humano. Concluída a instrução probatória, foram os autos conclusos para sentença.
Considerando os fatos acima relatados, redija a sentença cível, dando solução ao caso. Analise toda a matéria de direito processual e
material pertinente para o julgamento, fundamente suas explanações, dispense a narrativa dos fatos e não crie fatos novos.
Relatório – Dispensado pelo enunciado.
FundamentaçÃo
Preliminares
Em preliminar a defesa de Carla arguiu ilegitimidade passiva em razão de não estar presente durante a ocasião do acidente, tendo como única atitude o empréstimo do automóvel. A referida nulidade deverá ser rejeitada, visto que a legitimidade deve ser analisada preliminarmente através da teoria da asserção, com base unicamente na análise das afirmações contidas na petição inicial (in status assertionis), não importando se verdadeiras ou falsas as afirmações. Assim, a legitimidade ativa da ré encontra-se presente diante do fato de ser proprietária do veículo automotor, ainda, outras indagações sobre a responsabilidade da parte, Carla, deverão ser aprofundadas na análise do mérito.
Mérito
No mérito as partes alegaram culpa exclusiva da vítima e concorrência de culpas com os pais, responsáveis pela criança. A alegação não será acolhida.
No caso, não há que se falar em culpa exclusiva da vítima ou em concorrência de culpas, conforme o depoimento da testemunha, o autor do fato estava efetivamente conduzindo o veículo automotor em alta velocidade, e ainda, que o local em que as crianças brincavam era calmo e usualmente utilizado para o lazer dos menores, mencionando-se ainda o fato de ter sido emprestado o automóvel por Carla a Daniel, que não possui carteira de motorista.
Outrossim, os reus não se desincubiram do onus da prova, não demonstrada a ausência de vigilância dos pais, conforme artigo 336 do Código de Processo Civil, ocorrendo na verdade o exercício regular do direitos dos pais.
Resta, dessa forma, que o dever de indenizar está plenamente caracterizado uma vez existente o dano pela morte do filho, a conduta imprudente das partes Daniel e Carla, e o nexo causal relativo ao atropelamento, conforme artigo 186 e 927 do Código Civil. A falta de prova pericial alegada pela defesa não é suficiente para desfigurar o dever de reparação, uma vez que o Juiz como destinatário das provas tem o dever de fundamentação e acolhimento racional das alegações, considerando ainda que a defesa não se conseguiu provar situação excludente da responsabilidade, conforme artigo 371 do CPC.
No caso da ré Carla, a responsabilidade aplicada ao caso é a objetiva e solidária, uma vez que assumiu a responsabilidade pela escolha do empréstimo a pessoa sem habilitação para dirigir o veículo.
Uma vez caracterizado o dever de indenizar, cumpre apontar que a fixação dos danos morais deve levar em consideração a proporcionalidade. Dessa forma, em aplicação do método bifásico utilizado pelo Superior Tribunal de Justiça, em um primeiro momento deve-se analisar casos semelhantes para ficar o valor base, e em seguida verificar a situação do caso concreto.
Dessa forma o valor da indenização deve ser fixado em R$ 90.000,00 (noventa mil reais), valor que se mostra razoável diante do bem perdido, a vida, de valor superior aos bens materiais, além de considerar a situação econômica da parte ré.
Quanto ao pedido de pensão por morte, o Superior Tribunal de Justiça tem admitido sua fixação tendo como requisito a situação financeira comprovada da parte requerente situação excepcional que não pode ser presumida. Dessa forma o pedido da pensão por morte não é acolhido.
Ante o exposto, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva da parte, Carla, e no mérito julgo parcialmente procedentes os pedidos dos autores da ação, com apreciação do mérito conforme artigo 487, I, do CPC, para:
a) Condenar as partes rés ao pagamento de danos morais no valor de R$ 90.000,00 (noventa mil reais), com correção monetária a partir do arbitramento e acrescido de juros de mora a contar do evento danoso, conforme artigo 406 do Código Civil.
b) Considerando a sucumbência mínima da parte autora, condenar os réus nos honorários advocatícios no valor de 10% sobre a condenação.
Local e Data
Juiz de Direito Substituto
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
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