Um cidadão, sentindo-se prejudicado devido à averbação de uma escritura de compra e venda de imóvel, ingressou com ação judicial contra o oficial do registro de imóveis de determinado município, requerendo ressarcimento por danos morais e materiais, e ofereceu representação ao Ministério Público para que fosse instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade administrativa. Concomitantemente, em fiscalização efetuada pelo tribunal de justiça competente, constataram-se irregularidades no registro de imóveis e na cobrança indevida de valores pelos serviços prestados.
Algumas pessoas que haviam sido beneficiadas com essas irregularidades, ao tomarem conhecimento das investigações, ingressaram com processo judicial a fim de preservarem a situação jurídica fática alcançada, sob a alegação de direito adquirido, segurança jurídica e aplicação da teoria do fato consumado. Ao julgar esses processos judiciais, o Poder Judiciário declarou a existência de vício nos registros imobiliários e sua consequente nulidade.
Em decorrência dessa decisão, as partes prejudicadas com os registros irregulares resolveram ingressar com ação contra o município e o estado, visando à reparação do dano, alegando responsabilidade civil do município em que se encontram os imóveis e do respectivo estado. As partes argumentaram que sofreram danos morais e materiais irreparáveis pelos atos praticados pelo oficial de registro e que, mesmo em se tratando de serventia extrajudicial, a pessoa jurídica de direito público deveria ser responsabilizada.
A respeito da situação hipotética acima descrita, redija um texto dissertativo que aborde, necessariamente e de forma fundamentada, os seguintes aspectos:
- responsabilização de notários e registradores por improbidade administrativa;
- aplicação da teoria do fato consumado aos atos administrativos realizados pelo oficial de registro;
- legitimidade ad causam e responsabilidade civil dos entes federativos.
O art. 37 da CF/88 sagra a responsabilidade objetiva do Estado perante danos causados a terceiros por seus agentes nesta qualidade. Esta norma foi reafirmada como a regra por ocasião do RE 842846, em que o STF estabeleceu a responsabilidade primária e direta do Estado em favor de terceiros prejudicados por atos de notários e registradores, sendo mandatório, contudo, que logo após a condenação, o Estado ajuize ação autônoma regressiva quanto aos delegatários, que devem responder por dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa contra o gestor que tenha negligenciado a ação de regresso.
Nesta linha, dado que os cartorários exercem atividade de natureza pública, ainda que delegatários e, cobrem taxa sob o regime tributário, a Lei de Improbidade alcança estes profissionais caso violem qualquer conduta vedada pela Lei 8.429/92.
No caso apresentado, portanto, as vítimas do notário devem ajuizar ação contra o Estado, que possui legitimidade passiva no feito. Superada esta questão, o Estado ainda detém legitimidade ativa para reaver o montante pelo qual se responsabilizou (tema nº 777 Repercussão Geral).
Quanto à produção de efeitos pelos atos viciados, há corrente teórica que apoiada sobre a segurança jurídica e a teoria da aparência defende a manutenção do ato viciado, em razão da necessidade de se estabilizar as relações jurídicas já contraídas e publicizadas. A aplicação desta tese, todavia, usualmente está atrelada ao grande transcorrer de lapso temporal sem que o Judiciário proveja a resolução da causa ou, ainda, que o dano da retirada do ato seja concretamente maior do que o de sua manutenção. Por estes motivos, a análise particular de cada ação ajuizada pelos cidadãos particulares definirá o acolhimento ou não deste tese.
Por fim, caso a averbação maculada tenha efeitos ambientais, como por exemplo a redução de área de proteção ambiental que fira lei expressa, é inafastável, prima facie, nos exatos termos da Súmula 613 do STJ ("Súmula 613-STJ: Não se admite a aplicação da teoria do fato consumado em tema de Direito Ambiental").
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
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