Leia atentamente o art. 37, § 6º, da Constituição. Imagine um caso concreto em que servidores de um hospital público, integrante da estrutura do Ministério da Saúde, tenham se omitido em determinados procedimentos no atendimento de determinado paciente (deixaram de realizar o tratamento pós-cirúrgico), o que implicou agravamento na saúde do indivíduo que se viu impedido de retornar ao trabalho. A intervenção cirúrgica, que normalmente envolveria um período de internamento e alta de 48 (quarenta e oito) horas, inabilitou o paciente por 15 (quinze) dias.
No caso concreto, essa omissão pode resultar na responsabilidade objetiva do Poder Público? A resposta, que deve ser concisa, precisa mencionar, fundamentadamente e com autonomia, os seguintes temas: (i) o conceito de responsabilidade objetiva do Estado; (ii) o cabimento ou não da responsabilidade objetiva por omissão; (iii) qual o dano eventualmente indenizável no caso concreto; (iv) se pode existir responsabilidade solidária, subsidiária ou concorrente e a quem se dirigiria (Não é necessário observar a ordem dos assuntos, desde que todos sejam mencionados de forma explícita).
No Brasil, a responsabilidade civil estatal, regra geral, é objetiva desde a Constituição de 1946. Está prevista na Constituição Federal de 1988, em seu art. 37, § 6º e subsume-se à teoria do risco administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto para as omissivas, pois foi afastada a teoria do risco integral.
Na teoria do risco administrativo, não há a responsabilidade civil genérica e indiscriminada do Estado. Já na teoria do risco integral, a responsabilidade sequer está sujeita à existência de nexo causal, ocorrendo até mesmo em casos de culpa exclusiva da vítima.
Assim, tanto as pessoas jurídicas de direito público como as pessoas jurídicas de direito privado que prestem serviços públicos são responsáveis pelos atos danos que seus agentes, imbuídos dessa qualidade, causem a terceiros, sendo assegurado o direito de regresso contra os responsáveis, desde que presente dolo ou culpa.
A teoria do risco administrativo como fundamento da responsabilidade objetiva das pessoas supracitadas, independe de a natureza do ato ser comissiva ou omissiva. De qualquer sorte, o dever de reparação exige a demonstração de três requisitos: a conduta, o dano e o nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo.
No caso em tela, a atitude omissiva dos servidores, enseja responsabilidade objetiva estatal, pois houve omissão específica do Estado que agia na condição de garante (guardião da saúde do doente), sendo a situação criada por quem tinha o dever de agir para impedir agravamento na saúde do paciente.
A CF/88, em seu artigo 6º, coloca a saúde no rol de direitos sociais e em seu artigo 196 dispõe que “é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.
Nesse sentido, no caso em exame, seriam cabíveis danos materiais (desde que comprovado prejuízo), pois o período pós-operatório foi dilatado e danos morais pelo transtorno vivenciado, pela falta de tratamento em momento oportuno.
Não há que se falar em responsabilidade solidária, sendo responsabilidade exclusiva do ente federal, responsável pelos servidores do Ministério da Saúde.
Ótima resposta, tocando em pontos inclusive além do pedido pelo examinador, a exemplo da saúde como direito social e os dispositivos constitucionais. Acredito que faltou no ponto falar sobre se havia responsabilidade subsidiária ou concorrente – e a quem se dirigiria.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
8 de Fevereiro de 2019 às 01:40 RIVANDA BARRETTO disse: 0
Excelente resposta. Apenas acrescentaria que há correntes doutrinárias que não aplicam a responsabilidade objetiva em caso de omissão. Afirmam que, em casos de omissão, aplica-se a Teoria da Responsabilidade Subjetiva decorrente da Culpa Anônima ou Culpa do serviço público. A má prestação do serviço ou a prestação ineficiente geraria a responsabilidade subjetiva do estado. No entanto, para o STF, o Estado responde de forma objetiva pelas suas omissões. Contudo, o nexo de causalidade entre essas omissões e os danos sofridos pelos particulares só restará caracterizado quando o Poder Público tinha o dever legal específico de agir para impedir o evento danoso e mesmo assim não cumpriu essa obrigação legal.
Assim, o Estado responde de forma objetiva pelas suas omissões, desde que ele tivesse obrigação legal específica de agir para impedir que o resultado danoso ocorresse. A isso se chama de "omissão específica" do Estado. O que ocorreu no presente caso, pois saúde é dever legal de todos os entes federativos.