Clara
recebeu dos cofres públicos estadual, durante três anos, os proventos do seu
falecido marido, como se vivo estivesse. Constatada a irregularidade, Clara
obrigou-se a ressarcir o erário através de descontos no pagamento de sua
pensão, aderindo a um acordo escrito.
Posteriormente, Clara moveu ação de revisão de pensão, na qual
surgiram dúvidas acerca de tal acordo, bem como do valor já liquidado. Houve
determinação judicial para que o Secretário Estadual da Fazenda trouxesse aos
autos tal documento. Foram prestadas informações pelo Secretário, acompanhadas de um
demonstrativo contendo a quantificação do valor da dívida, o valor do benefício
pago a Clara e os valores deduzidos mês
a mês.
Como o documento do acordo não
foi juntado aos autos pela Administração, Clara impetrou habeas
data contra o
Secretário Estadual da Fazenda, que restou julgado improcedente, com a
condenação de Clara ao pagamento das custas processuais e de honorários
advocatícios.
Responda fundamentadamente:
a) em que consiste o habeas data?
b) caso fosse julgador, também concluiria pela improcedência da
ação?
c) são exigíveis custas e honorários advocatícios em habeas data?
O habeas data é um remédio constitucional, uma garantia constitucional que visa à proteção do direito de acesso à informação da pessoa do impetrante e direito à retificação de seus dados constante em registros ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público, conforme o art.5º, LXXII, da CF/88.
O direito de acesso às informações e disciplina o rito processual do habeas data é regulamentado pela Lei 9507/97.
A referida lei dispõe no art. 7º que o Habeas Data é cabível para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registro ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público; para a retificação de dados; para a anotação nos assentamentos do interessado, de contestação ou explicação sobre dado verdadeiro, mas justificável e que esteja sob pendência judicial ou amigável.
A impetrante pretende a exibição de um termo de acordo no qual se obrigou a ressarcir o erário através de descontos no pagamento de sua pensão.
De início, verifica-se que a impetrante não apresentou um dos requisitos essenciais para a impetração do Habeas Data, qual seja, a comprovação da recusa por parte do Poder Público, conforme art.8º, parágrafo único da lei 9507/97.
Ademais, o referido remédio não é o instrumento adequado para o fim a que pretende a impetrante (exibição de termo de acordo), pois tem por finalidade dar acesso a uma informação que conste no banco de dados que possa ser transmitida para terceiros e não acesso a cópia de documento de teor conhecido, conforme pretende.
A impetrante requer a exibição de cópia de instrumento de acordo contido em processo administrativo, a qual não é possível em sede de Habeas Data.
Assim, tendo em vista o não preenchimento dos requisitos e pressupostos para a impetração de Habeas Corpus, mais correto seria o indeferimento da inicial e consequente extinção sem julgamento do mérito, nos termos do art.10 da lei 9507/97, art.330, III e art.485, I do NCPC e não o julgamento pela improcedência.
Importante destacar que Clara deveria requerer tão somente a exibição incidental do documento na própria ação de revisão, por força do que dispõe o art. 396 do CPC. Veja-se que, conforme o caso narrado no enunciado, Clara fez referencia ao acordo, havendo inclusive determinação judicial para que o Secretário Estadual da Fazenda trouxesse aos autos tal documento. Por essa razão, verifica-se também a ausência de interesse de agir da impetrante, o que também levaria a extinção sem julgamento de mérito do remédio constitucional por força do art.485, VI, do NCPC.
A Ação de Habeas Data é gratuita, conforme art.5º, LXXVII, CF/88, bem como o art.21 da lei regulamentadora. Ainda, a referida lei estabelece a gratuidade do procedimento administrativo para acesso a informações e retificação de dados e para anotação de justificação.
Tendo em vista que a ação de Habeas Data foi julgada improcedente, não havendo comprovação de má-fé, a condenação em custas processuais da impetrante não procede. Quanto aos honorários advocatícios de sucumbência a CF/88 e a lei 9507/97 não previram qualquer isenção, todavia, prevalece na doutrina e na jurisprudência que os honorários não incidem nos remédios constitucionais.
O STJ e o STF possuem súmula sobre a impossibilidade de cobrança de honorários advocatícios no mandado de segurança, podendo-se usar o mesmo raciocínio para o Habeas Data, tendo em vista que ambos são remédios constitucionais que visam assegurar direitos fundamentais conferidos na CF/88.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
14 de Julho de 2018 às 15:16 daiane medino da silva disse: 0
Excelente resposta Mari,
Acabei errando ali, para fazer rápido, mas a resposta merece um 10.
Abordou todos os pontos, com citação de artigos e entendimento Sumular correspondente.
Muito bom,
Apenas complementando, o habeas data, embora inovação na Constituição Federal de 1988, não era novidade em sede de Direito Comparado, visto alguns países já possuírem previsão legal ou mesmo constitucional de garantia ao cidadão de informações de dados que sobre si possuíam entidades e órgãos públicos.
Neste sentido, conforme magistério do doutrinador Arnold Wald, é importante asseverar que instituto assemelhado ao habeas data remonta à legislação ordinária dos Estados Unidos da América, especificamente a Freedom of Information Act de 1974, alterado pelo Freedom of Information Reform Act de 1978, que visava possibilitar o acesso do particular às informações constantes de registros públicos ou particulares permitidos ao público.