A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem ampliado a chamada "modulação dos efeitos" da pronúncia de inconstitucionalidade da lei. Analise a compatibilidade de tal prática para com o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, assim como o momento adequado e a legitimidade para a sua provocação, bem como a sua aplicabilidade às leis que instituem ou majoram tributos.
Enraizada em nosso ordenamento jurídico, a “modulação dos efeitos” da pronúncia de inconstitucionalidade de normas tem por objetivo restringir os efeitos da decisão, seja para estabelecer a sua eficácia a partir do trânsito em julgado, conferindo-lhe “efeito ex nunc”, seja para postergar sua eficácia para determinado momento futuro, mediante a definição de efeitos prospectivos. Aludida técnica, consoante aponta a melhor doutrina, cuida de flexibilizar o sistema de nulidades, de origem norte-americana e adotado no âmbito do controle de constitucionalidade brasileiro, na medida em que permite afastar, episodicamente, a eficácia “ex tunc” inerente à declaração de inconstitucionalidade de normas, aproximando nosso sistema daquele de matriz austríaca ou kelseniana, em que a invalidade da norma inconstitucional, porque de natureza desconstitutiva, é despida de efeitos retroativos. Prevista expressamente no artigo 11 da Lei n. 9.882/99 e também no artigo 27 da Lei n. 9.868/99, a modulação de efeitos dar-se-á quando, pronunciada a inconstitucionalidade de norma em sede de ADI, ADO, ADC ou ADPF, houver por bem o STF, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos da decisão, tendo em perspectiva razões de segurança jurídica ou excepcional interesse social. Vale anotar que, malgrado positivada no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade, é uníssona a compreensão da Suprema Corte por sua aplicabilidade também em sede de controle difuso, respeitados os parâmetros e pressupostos legais, posição, a propósito, doutrinariamente defendida por Gilmar Mendes. A título de ilustração, aludida técnica foi empregada pelo STF, acertadamente, a fim de afastar os efeitos da inconstitucionalidade de medidas provisórias que, em seu texto, abrigavam disposições sem pertinência temática, bem como na paradigmática decisão que declarou inconstitucional o regime de precatórios instituído pela EC 62/09, com o fito de assegurar os pagamentos já realizados. De ver-se, pois, que a modulação de efeitos é inexoravelmente compatível com o controle de constitucionalidade, na medida em que franqueia à Corte Máxima, por meio de quórum qualificado, tutelar o ordenamento jurídico em prol dos cidadãos, sob as lentes do interesse público e da segurança jurídica, vetores imprescindíveis a todo e qualquer sistema jurídico. Por isso mesmo, segundo a Suprema Corte, é ampla a legitimidade para requerê-la, franqueando-se não só às partes – incluído o MPF, o AGU e “amici curiae” –, mas a quaisquer dos ministros ou mesmo o relator, de ofício, o poder-dever de instar a modulação de efeitos a todo o tempo até o trânsito em julgado, formulando pedido inclusive por intermédio de embargos de declaração, após a prolação da decisão. Por fim, no que concerne à aplicabilidade da modulação dos efeitos a questões tributárias, a despeito da controvérsia doutrinária a esse respeito, tem-se que é técnica é inexoravelmente compatível, desde que aferida a presença dos pressupostos legais de mister, como tem apontado decisões da Suprema Corte, a teor do que se observa na modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional o prazo instituído pela Lei n. 8.212/91 para o recolhimento de contribuições previdenciárias. Ora, se é possível concluir pela existência de prejuízo à segurança jurídica e ao interesse público na declaração de inconstitucionalidade de lei que haja minorado a carga tributária, de igual modo é causa de instabilidade ao ordenamento o pronunciamento de inconstitucionalidade de lei que institua ou majore tributos, a impor o sopesamento dos valores em jogo, casuisticamente, a fim de se obter a resposta mais adequada. Vale mencionar que, em casos que tais, o valor recolhido ao erário teve previsão orçamentária e, em geral, destino específico – isto é, a manutenção do próprio Estado Democrático de Direito, aqui abarcados, evidendemente, os direitos fundamentais dos cidadãos, com destaque para aqueles de índole social. Seja como for, argumentos de índole meramente consequencialista, em que subjaz o interesse público secundário, isto é, o arrecadatório, não terão o condão de autorizar a modulação de efeitos, sob pena de se transverter a própria teleologia do instituto e fazer esmorecer, “ipso facto”, as garantias constitucionais do cidadão em face do poder do Estado tributante.
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