No dia 12 de outubro de 2015, Felisberto, representante comercial, primário e sem antecedentes, estava a caminho do aeroporto internacional de Campo Grande quando parou em um bar para tomar água e aguardar um tempo até a chegada de seu colega que o levaria ao aeroporto para embarcar com destino a São Paulo. Dentro do bar, Felisberto foi abordado por policiais civis que teriam recebido uma denúncia anônima afirmando que Felisberto era traficante e iria viajar para São Paulo transportando drogas. Durante a abordagem, os policiais pediram a Felisberto para abrir a mala que carregava consigo, o que foi atendido imediatamente, tendo sido encontrado dentro da mala apenas algumas roupas, sapatos e itens de uso pessoal. Os policiais, no entanto, desconfiaram do nervosismo de Felisberto, e procederam a busca pessoal, momento em que encontraram 2.750 gramas de cocaína colados ao corpo de Felisberto com fita adesiva. A droga foi imediatamente apreendida e Felisberto preso. Os policiais ainda apreenderam as passagens aéreas, R$ 1.200,00 (hum mil e duzentos reais) em espécie e dois aparelhos celulares que estavam em poder do preso. Felisberto foi apresentado à autoridade policial competente, que ouviu os agentes que efetuaram a prisão e as testemunhas que estavam no bar no momento da prisão, ordenou a apreensão da droga, dos valores e celulares e determinou a lavratura do auto de prisão em flagrante delito de Felisberto, que se recusou a assinar o auto de prisão, razão pela qual a autoridade policial determinou que os mesmos agentes que prenderam Felisberto assinassem a rogo. A droga foi encaminhada para exame preliminar, cujo resultado foi positivo para cocaína. No dia 14 de outubro a família de Felisberto foi comunicada da prisão e a nota de culpa foi entregue ao preso. Felisberto alegou não possuir advogado. Nessa mesma data, o auto de prisão em flagrante foi enviado ao juízo competente e cópia para o Ministério Público e para a Defensoria Pública.
Com base na situação hipotética apresentada e sem inserir nenhuma informação não contida no problema, responda, de forma motivada e fundamentada: O que deve fazer o juiz ao receber o auto de prisão em flagrante? O magistrado pode relaxar o flagrante ou determinar que a prisão seja mantida?
Na situação apresentada, o juiz deve fundamentadamente relaxar a prisão em flagrante nos termos do art. 310 do CPP, art. 5º, LXV da CRFB/88 e art. 7º, nº. 06 do Pacto de São José da Costa Rica, por se tratar de prisão ilegal, feita sem observância aos requisitos que regem o tema.
Inicialmente, cumpre salientar que a busca pessoal é autorizada pelo art. 240, §2º do CPP e independe de mandado, podendo ser realizada quando ocorrerem fundadas suspeitas de que alguém oculte consigo produtos ou instrumentos de crime, nos termos das alíneas "b" a "f" e "h" do supracitado artigo.
Vale destacar, também que apesar da prisão em flagrante ter ocorrido com base em denúncia anônima, tal fato por si só não torna a prisão ilegal, eis que a autoridade recebeu denúncia anônima de que um crime estava sendo cometido em determinado lugar, acessível ao público, compareceu ao local, verificou a procedência das informações e constatou a prática de delito, estando também presente o aspecto temporal do flagrante (art. 302, I CPP), sendo neste ponto válida a prisão.
Contudo, após a efetivação da prisão em flagrante, houve o descumprimento de várias disposições legais que acabaram por tornar a prisão de Felisberto ilegal.
Neste sentido, observa-se que Felisberto se recusou a assinar o auto de prisão, razão pela qual a autoridade policial determinou que os mesmos agentes que prenderam Felisberto assinassem a rogo, procedimento incorreto, uma vez que o art. 304, §3º do CPP estabelece que quando o acusado se recusar a assinar o auto de prisão em flagrante, este deverá ser assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença do acusado.
Também, extrai-se do caso em apreço que somente no dia 14 de outubro a família de Felisberto foi comunicada da prisão e a nota de culpa foi entregue ao preso, o que viola o art. 306 caput e §2º do CPP, art. 50 da Lei 11.343/06 e o art. LXII da CRFB/88, que determinam que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão imediatamente comunicadas ao Juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada, devendo a nota de culpa ser entregue no prazo de 24 (vinte e quatro horas) ao preso, mediante recibo.
Por fim, verifica-se que apenas 48 (quarenta e oito horas) após a prisão em flagrante, o auto de prisão em flagrante foi enviado ao juízo competente e cópia para o Ministério Público e para a Defensoria Pública, o que fere o disposto no art. 306, §1º do CPP e art. 50 da Lei de Drogas, que preceituam que em até 24 (vinte e quatro horas) após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e a Defensoria Pública, uma vez que Felisberto não possuía advogado, dando-se vista ao Ministério Público no mesmo prazo.
Assim, conclui-se que a prisão de Felisberto se deu de forma ilegal, devendo ser relaxada nos termos dos arts. 310, I do CPP e art. 5º, LXV da CRFB/88, sendo impossível sua conversão de uma prisão ilegal em prisão preventiva (art. 312 do CPP).
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