Discorra sobre a seguinte assertiva: Com as últimas reformas legislativas, alguns artigos do CPP, com traços do sistema penal inquisitório, foram revogados ou alterados, mas persistem dispositivos em descompasso com o sistema constitucional acusatório.
O Decreto-lei 3689/41 que deu origem ao Código Penal vigente, passou no decorrer dos anos por profundas mudanças, especialmente após o advento da CF/88 a qual definiu, de maneira expressas, a separação das funções de acusar e julgar no processo penal, revelando a garantia de um sistema acusatório alinhado aos ditames da nova ordem pós-positivista.
Entretanto, a despeito das significativas mudanças, remanesceram no Código alguns artigos cuja previsão normativa, quando não incompatíveis, ensejam interpretação conforme a nova dogmática constitucional, posto estarem em descompasso com o sistema de garantias processuais do acusado, bem como com o atual papel do juiz na condução do processo.
Pode-se citar, como exemplo de resquícios do sistema inquisitivo, os seguintes artigos com as respectivas previsões.
a) art. 28 segundo o qual cumpre ao juiz exercer controle sobre o arquivamento do inquérito policial. Crítica-se pelo fato de que, na nova ordem constitucional, o MP é o dominus litis cumprindo a ele, por conseguinte, o controle interno do inquérito posto ser instrumento a favor da ação penal. Há propostas legislativas tendentes a conferir o controle do ato no ambito interno do MP.
b) art. 158 segundo o qual o exame de corpo de delito será obrigatório nas infrações que deixarem vestígios. Num sistema de livre apreciação da prova pelo juiz, o CPP manteve elemento do sistema da prova tarifada ao impor determinado mecanismo de colheita de prova em detrimento de outros.
c) art. 311 cuja previsão estabelece a prisão preventiva decretada de ofício pelo juiz no curso do inquérito. Contrasta com o sistema acusatório segundo o qual o juiz não deve se pronunciar antes de instaurada a ação penal, ressalvada as provas cautelares e irrepetíveis. O Brasil não adota o chamado "juízo de instrução" já adotado por sistemas Europeus, aventando-se o risco de quebra de imparcialidade na condução do processo.
d) art. 585 prevê o requisito da prisão para que o acusado possa recorrer da sentença de pronúncia. Tal artigo é de patente inconstitucionalidade pois viola do direito a ampla defesa e contraditório, servindo também como desestímulo ao esgotamento das vias recursas, retratando a época em que o acusado era objeto de prova e não sujeito de direitos.
Cumpre destacar que tanto o STF quanto o STJ pacificaram posições de parcela dos artigos mencionados, notadamente aqueles que violam o princípio da inércia da jurisdição penal e do sistema acusatório e respectivas garantias processuais.
Por derradeiro, importa ressaltar que o sistema vigente, a despeito da maioria da doutrina mencionar tratar-se de acusatório puro, há quem sustente que, pelas brechas acima mencionadas, tratar-se-ia de um sistema híbrido, justamente pela existencia de resquícios da época inquisitiva, mormente quando prevê iniciativa de ofício do juiz.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
7 de Março de 2018 às 12:49 Marco Aurélio Kamachi disse: 0
Correção: sistema misto - previsão de fase inquisitiva (inquérito); previsão de fase acusatória (processo); o correto seria falar de " não recepção" do art. 585 posto ser norma originária do Decreto que fundamenta o Código;