Examine a situação descrita e responda as questões formuladas em conformidade com a Constituição de 1988 e com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Tramita no Congresso Nacional proposta de emenda constitucional PEC apresentada por um terço dos membros da Câmara dos Deputados que pretende prorrogar contribuição social que fora instituída por Emenda Constitucional para prazo certo de vigência prestes a expirar.
Após discutida e votada em dois turnos, a PEC é aprovada pela Câmara dos Deputados com fórmula que submete a prorrogação pretendida ao disposto no § 6º do art. 195 da Constituição.
Após discutida e votada em dois turnos, a PEC é aprovada no Senado Federal com uma modificação: a supressão da fórmula relativa à submissão da prorrogação ao disposto no § 6º citado.
Sem retornar à Câmara dos Deputados, a PEC vai à promulgação, que é agendada para sessão conjunta das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, especialmente convocada para tanto.
Antes da promulgação, a Assessoria para Assuntos Parlamentares do Gabinete do Ministro de Estado da Fazenda submete o assunto à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, onde é distribuído à Coordenação-Geral de Assuntos Tributários em que você acaba de entrar em exercício no cargo de Procurador da Fazenda Nacional. As questões cuja análise é solicitada são as seguintes:
1. A legislação sobre matéria tributária é da iniciativa privativa do Presidente da República? Em caso positivo, o tema poderia ser objeto de PEC apresentada por um terço dos membros da Câmara dos Deputados? Fundamente ambas as respostas.
2. No caso descrito, é possível a promulgação da PEC sem que ela tenha retornado à Casa iniciadora para que seja, uma vez mais, discutida e votada em dois turnos em razão da modifi cação ocorrida? Por quê?
3. Na situação descrita é necessário observar o disposto no § 6º do art. 195 da Constituição? Por quê?
4. Da redação final da PEC não consta nenhuma cláusula de vigência. Aplica-se, no caso, a regra geral constante do caput do art. 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro? Por quê?
1. Inicialmente, cumpre esclarecer que, conforme entendimento pacífico, tanto em doutrina quanto em jurisprudencia, os temas pertinentes ao Direito Tributário não se submetem à iniciativa privativa do Presidente da República, no tocante à deflagração do processo legislativo.
Isso porque a Constituição Federal bem delimitou as competências tributárias de cada ente político, de modo que cabe aos respectivos órgãos legislativos disciplinar a instituição e a majoração de tributos, entre outras hipóteses igualmente sujeitas ao princípio da legalidade, sendo que a própria Lei Fundamental tratou de explicitar algumas exigências dirigidas, especialmente, ao legislador, a exemplo da edição de lei complementar em determinados casos, não o fazendo, porém, com relação à iniciativa para a propositura de leis em matéria tributária, que, em conclusão, é partilhada entre o Presidente da República e o Poder Legislativo.
Outrossim, deve-se atentar para o disposto no artigo 61, § 1º, II, “b”, da CF, que defere iniciativa privativa ao Presidente da República somente em matéria tributária de interesse dos Territórios Federais, que constituem descentralizações político-administrativas imediatamente sujeitas à União, sendo essa, inclusive, competente para instituir e cobrar os impostos estaduais e, eventualmente, os municipais, no âmbito dos Territórios federais, conforme dispõe o artigo 147 da CF.
Assim, considerando que não se pode falar em iniciativa privativa do Presidente da República em matéria tributária, não há qualquer vício de inconstitucionalidade formal na proposta de emenda constitucional proposta por um terço dos membros da Câmara dos Deputados, estando, pois, em perfeita consonância com o que preceitua o artigo 60, I, da CF.
2. Sob o aspecto procedimental, padece de vício de natureza formal a PEC em análise, cujo texto sofrera alterações durante a sua tramitação perante o Senado Federal, devendo ter retornado à Câmara dos Deputados, para que fosse submetida a nova deliberação.
Ocorre que, diferentemente do procedimento estabelecido para o processo legislativo ordinário, as propostas de emenda constitucional, devido ao maior rigor em sua elaboração, necessitam ser aprovadas com o mesmo texto em ambas as Casas do Congresso Nacional.
Assim, caso alterado o texto originalmente apresentado, tal como se verificou no caso em pauta, a proposta deverá retornar à outra Casa, para que seja objeto de nova deliberação e, eventualmente, de aprovação com base no texto modificado.
3. O artigo 195, § 6º, da Constituição Federal consagra o princípio da anterioridade tributária no contexto das contribuições da seguridade social, que só poderão ser exigidas depois de decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as instituiu ou modificou, não se lhes aplicando a anterioridade anual ou de exercício, capitulada no artigo 150, III, “b”, da CF.
No caso em apreço, conquanto não tenha havido proposta de instituição ou de majoração de tributo, é certo que o intuito de prorrogação de contribuição social em vigor, com o fim de impedir a expiração do prazo para o qual fora criada, tem o condão de, por si só, violar a garantia fundamental e também princípio da anterioridade nonagesimal, cuja razão maior de ser se fundamenta, justamente, na evitação de surpresas legislativas em detrimento do contribuinte, assim suprimindo a sua liberdade de planejamento econômico e financeiro com relação às novidades em matéria tributária.
Portanto, a prorrogação de contribuição social, instituída com prazo certo para vigorar, sem a observância do princípio da anterioridade nonagesimal do artigo 195, § 6º, da CF, é medida que atenta contra garantia fundamental do contribuinte, e cláusula pétrea por excelência, nos moldes do artigo 60, § 4º, IV, da CF, razão pela qual a PEC padece de vício de inconstitucionalidade material.
4. Não se aplica a regra disposta no artigo 1º, “caput”, da Lei de Introdução às Normas do Direito brasileiro, o qual tem incidência restrita às leis em geral, de maneira que as emendas constitucionais contam com vigência imediata, na data da sua publicação, salvo se o próprio texto trouxer disposição em sentido contrário.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
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