P.L. de C. e E.D. das N., moradores em área de invasão urbana e ocupantes de imóvel não legalizado, acionaram o Município de X, via ação pelo rito ordinário de obrigação de fazer, afirmando da ausência de esgotamento sanitário na localidade, que resultava em transbordamento de uma vala negra com criação de condições insalubres para o local em geral e os autores em particular. Pretendiam então fosse o Município compelido, judicialmente, a realizar as obras necessárias à solução deste problema sanitário da localidade, ao fundamento de exercício de seus direitos à prestação dos serviços públicos de forma eficiente e adequada bem como de manutenção de sua saúde e segurança da população, na forma do art. art. 9º, §1º, da CRFB c/c o art. 11, parágrafo único da Lei nº 7.783/89, que o regulamentou.
Em sua defesa, o Município de X sustentou que a decisão de realização, ou não, de obras de saneamento é ato não sindicável pelo Poder Judiciário pena de violação ao comando do art. 2º da CF/88. Disse mais que à época em que a previsão orçamentária para aquele exercício fiscal fora elaborado pelo Executivo Municipal, vindo a ser regularmente aprovado pelo Legislativo local, não constara da mesma previsão ou contabilização de gastos com obras de saneamento na forma da reclamação efetuada pelos autores e que estas seriam de sua competência exclusiva, cf. art. 23, IX da Constituição Federal.
Ouvido o MP, opinou o mesmo pela extinção do feito, sem resolução do mérito, pois que as obras que os autores demandam são eminentemente de utilidade coletiva e afetam a todos os moradores daquela localidade, e, em não tendo os demandantes legitimidade extraordinária para representar aqueles assim como o interesse objeto da presente lide é eminentemente difuso, a via eleita não se mostrava adequada.
Sendo estes os fatos e os posicionamentos dos atores deste processo, como o (a) candidato (a) se posicionaria acerca das questões constitucionais tratadas nesta demanda? Justifique.
Com relação aos argumentos do Município, o STF tem entendido que é possível ao Judiciário determinar à Administração Pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas ou na execução de obras relacionadas às redes de esgoto.
O direito ao esgotamento sanitário está umbilicalmente ligado ao direito à saúde, uma vez que este contempla políticas sociais e econômicas que devem visar à redução do risco de doença e de outros agravos (artigo 196 da Constituição).
Nesse sentido, o direito à saúde é considerado como direito de segunda geração/dimensão e que se relacionam com liberdades positivas, ou seja, exigem do Estado determinada prestação.
É certo que o dever de formular e implementar as políticas públicas incumbe, primariamente, aos Poderes Executivo e Legislativo.
Entretanto, caso os estes Poderes permaneçam inertes quanto a elaboração e/ou implementação de certas políticas públicas e esta omissão acabe por violar à Constituição, compete ao Poder Judiciário analisar tal questão e determinar a respectiva criação/concretização, sem que se possa falar em violação ao princípio da separação dos poderes.
Entende-se que eventual inércia do Poder Público violadora do direito à saúde se traduz em inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total ou parcial.
Não se descura da cláusula da reserva do possível no âmbito da teoria dos custos dos direitos, matéria constantemente arguida pelo Poder Público em sede defensiva.
Trata-se de tese originária da Alemanha e que se refere à possibilidade material da Administração efetivar direitos sociais, impondo, com base no princípio da proporcionalidade, uma limitação válida à concretização total desses direitos.
Não se ignora que a realização de direitos depende de vínculo financeiro que se subordina às possibilidades orçamentárias do Estado.
No entanto, conforme entendimento do STF, a cláusula da reserva do possível não pode ser invocada pelo Estado com a finalidade de se exonerar do cumprimento de suas obrigações constitucionais, salvo se demonstrado pelo Poder Público a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível.
O Poder Judiciário não poderá deixar de determinar que o Poder Público concretize o direito social sempre que a conduta negativa deste puder resultar nulificação ou aniquilação de direitos constitucionais considerados como fundamentais, tais como educação e saúde, por exemplo (mínimo existencial).
Quanto à tese hasteada pelo Ministério Público, os direitos fundamentais (e por consequência o direito à saúde) possuem dupla dimensão: subjetiva e objetiva.
A dimensão subjetiva se consubstancia na faculdade de o titular de um direito (no caso específico, saúde) de exigir do Estado (ou até mesmo de um particular, lembrando a eficácia horizontal dos direitos fundamentais) uma ação ou abstenção com a finalidade de preservar sua posição jurídica.
A dimensão objetiva, por sua vez, impõe a organização de uma atividade que contenha influência coletiva, funcionando como um programa que se dirige para a realização constitucional (no caso da saúde, tem-se que a saúde será garantida por meio de políticas sociais e econômicas).
Como consequência, diante da dimensão subjetiva do direito discutido, o autor tem legitimidade ordinária para a demanda.
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