Questão
MPF - 25º Concurso para Procurador da República - 2011
Org.: MPF - Ministério Público Federal
Disciplina: Direito Tributário
Questão N°: 007

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Enunciado Nº 001948

Locação de serviços e locação de bens móveis. Conceituar (máximo de 20 linhas).


À vista desses conceitos, indique a respectiva hipótese de incidência tributária ou a sua inexistência, nos fatos seguintes:


a) técnico efetua um programa para computadores sob encomenda de terceiro. Na hipótese, esse fato está sujeito a que imposto?


b) se o programa para computadores é colocado à venda, exposto como mercadoria, sobre esse futuro negócio jurídico, se realizado, haverá imposição tributária? Se afirmativo, qual?


c) se esse mesmo programa para computadores não é entregue para atender à encomenda e nem é vendido, mas alugado. Indaga-se: incide ou não tributação? Se positiva a resposta, qual o tributo devido?

Resposta Nº 001493 por GIlberto Alves de Azerêdo Júnior


A doutrina define a  “Locação de Bens”  como a relação jurídica decorrente de contrato bilateral, oneroso, comutativo, temporário, consensual e impessoal em que uma pessoa (locador) cede à outra (locatário) o uso e gozo do bem não fungível.  A principal característica deste contrato é a volta da coisa locada ao seu dono que recebe determinado valor pela locação. Há previsão deste contrato nos artigos 565 a 578 do Código Civil e em leis especiais, como a Lei de Locações.

Impende ressaltar desde já que a locação, independentemente do seu objeto, não corresponde ao comportamento previsto na hipótese de incidência do Imposto Sobre Serviços  (ISS). Isso porque não se pode confundir a cessão de um direito (uso e gozo) de um bem com o esforço humano contratado. A locação de bens móveis ou mesmo de serviço está fora do campo de incidência do ISS, por consubstanciar uma prestação de dar. Como se sabe, o ISS implica apenas um “fazer” – uma prestação de esforço humano a terceiro, com conteúdo humano, que pode redundar num bem material ou imaterial.

Nesse contexto, desde logo, insta realçar que o STF já há muito tempo entende que a locação de bem móveis não pode ser considerada serviço, porque não consiste em uma obrigação de fazer. Há inclusive uma Súmula Vinculante nesse sentido (Súmula Vinculante 11). Também é entendimento da nossa Corte Maior que em casos de locação não é possível também a incidência de ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), uma vez que não ocorre circulação econômica da mercadoria.

Destarte, deve ficar claro que a prestação de serviços se vincula a uma obrigação de fazer. Em outro prisma,  as circulações de mercadorias se vinculam às obrigações de “dar”. Estas últimas obrigações são bases materiais para incidência de outros impostos (ICMS , por exemplo), mas não o ISS.

Nesse contexto, em um caso em que um técnico efetua um programa para computadores sob encomenda de terceiro, deve haver a incidência do ISS, porquanto se trata de serviço elaborado especificamente para certo usuário e previsto em lista anexa da Lei Complementar 106/2003 ( lei nacional que prevê os serviços que podem ser tributados pelo entes municipais sob o prisma do ISS). Neste caso, não temos uma “mercadoria”, mas sim um bem incorpóreo decorrente de uma prestação de serviço.

Por outro lado, se o programa para computadores é colocado à venda, exposto como mercadoria, sobre esse futuro negócio jurídico, se realizado, haverá a incidência tributário do ICMS, já que, aqui, teríamos circulação de cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série ou escala e comercializados . Neste caso, trata-se de um bem corpóreo cujo escopo é ser distribuído para consumo, devendo ser tributado pelo ICMS, devido a circulação da mercadoria de uma pessoa para outra.

Já quando esse mesmo programa para computadores não é entregue para atender à encomenda e nem é vendido, mas alugado, não há incidência nem do ISS nem do ICMS. Isso porque não há, no caso, a obrigação de dar decorrente da prestação serviço, ensejadora do ISS. Da mesma forma, não há uma operação mercantil centrada numa obrigação de dar que “circula” juridicamente, ensejadora do ICMS.

Correção Nº 000784 por Guilherme


Boa tarde, Gilberto. Resposta impecável. Eu fui até estudar pra ter o que acrescentar. Como você praticamente esgotou o tema principal na resposta, resolvi fazer alguns acréscimos na questão da locação que com certeza não fariam diferença na sua resposta. Retirei do livro do Rosenval/2015.

1) Com o advento da CLT, a locação de serviços, típica das relações entre tomadores e prestadores de mão-de-obra, sai da esfera do CC, que passa a regular de forma residual a prestação de serviço, tal como prevê o art. 593. Por isso, atualmente, não é mais tão acurado falar em locação de serviço na seara cível. Essa noção de locação de serviço decorre da tripartição romana que foi adotada no CC/16 entre locação de coisa, locação do trabalho humano e locação de obra. Hoje também a locação de obra substituída pela ideia de empreitada.

2) Tem uma pergunta interessante no livro do Rosenvald: a cessão do corpo para publicidade temporária pode ser enquadrada no conceito de contrato de locação? Em outras palavras, eu posso alugar a minha testa para fazer uma propaganda temporária? A resposta dada pelo Rosenvald é que isso não pode ser considerado um contrato, pela ausência de patrimonialidade na disposição do corpo, o que, todavia, não significa que não haja negociabilidade possível na hipótese, desde que em conformidade com o art. 13 do CC: ausência de diminuição permanente da integridade física e adequação aos bons costumes. Se essa publicidade viola ou não os bons costumes é uma outra discussão bem mais complexa. Em síntese: se se chegar à conclusão de que essa disposição do corpo não fere os bons costumes, embora não se trate de contrato, pode haver negociação com contraprestação financeira.

3) Lembrando que o âmbito de aplicação do CC na locação é amplo no que diz respeito às coisas móveis e bem restrito quanto às imóveis, regulando as relações excluídas no art. 1º da Lei 8.245/91.

4) Com relação à tributação, acho que você foi bem no ponto. Faltou apenas um detalhe que acredito que lhe custaria alguns décimos: dizer que esse entendimento da incidência do ISS em produto feito sob encomenda é jurisprudência do STF. De fato, o Supremo entende que o programa feito por encomenda é considerado serviço e não mercadoria, razão pela qual na letra "a" incidiria ISS. Na letra "b", havendo a venda do produto no mercado, ainda que não haja dispositivo físico, incidirá ICMS, como você bem colocou (acredito que não precisaria nem haver venda em massa, podendo se tratar apenas da circulação de um programa para um comprador). E como sobre locação de coisa móvel não incide ISS, na letra "c" não haveria incidência de tributo.

E é só tudo isso....

 

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