As empresas de laticínios OST S/A e MANDEL S/A, com sede no Município do Rio de Janeiro, realizam uma fusão em março de 2013, passando a se chamar KAYA S/A.
Já em pleno funcionamento, recebem uma
notificação do CADE sobre a abertura de
processo administrativo para a análise
do negócio societário, bem como a imposição de multa
de vinte mil reais, para cada uma, por ausência
de comunicação prévia
à autarquia sobre a fusão.
Inconformadas, ingressam com ação anulatória na
Justiça Federal no Rio de Janeiro em
face do CADE, buscando anular o processo administrativo instaurado e a própria multa. Alegam que o negócio: 1)
pode sofrer controle prévio ou posterior pelo CADE; 2) diminuirá o preço do produto, em razão do aumento da
produção; 3) aumentará a oferta de emprego.
Como Juiz Federal Substituto da Vara Cível da Seção Judiciária do Rio de Janeiro para a qual foi distribuída a demanda, como V. Sª decidiria a questão?
Trata-se o pedido de pedido de anulação de processo administrativo instaurado pelo CADE, instaurado em face de fusão empresarial, a fim de apurar a regularidade do respectivo ato de concentração econômica.
Como sabido, o Conselho Adminitrativo de Defesa Econômica integra o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, estrutura de vital importância na seara econômica brasileira, porquanto previne e combate infrações contra a ordem econômica, de modo a garantir ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico.
Por sua vez, o CADE é estrutura judicante do SBDE, que responsável diretamente pela definição, julgamento e sanção das infrações à ordem econômica, sendo integrado pelos órgãos: Tribunal Administrativo de Defesa Econômica, Superintendência Geral e Departamento de Estudos Econômicos.
De outra banda, a Lei nº 12.529/2011, em seu art. 88 e seguintes, dispõem acerca da necessidade de observância de controle de atos de concentrações empresarial (quando, por exemplo, duas empresas resolvem se fundir, criando uma terceira empresa, como traz a hipotese dos autos), estabelecendo as situações em que se mostra necessária a aprovação do CADE para a efetivação dessas operações.
Regulamentando e intrumentalizando essa obrigatoriedade, dentre as diversas espécies de procedimentos administrativos que podem ser instaurados pelo CADE, está aquele que objetiva justamente a apuração de ato de concentração econômica, ou seja, por meio dele, o CADE irá avaliar se houve, ou não, ato de concentração econômica (nos termos do art. 90 da Lei nº 12.529/2011) e a imposição da multa caso se verifique a omissão no pedido de aprovação do ato de concentração. A instauração e instrução dese processo é de competência da Superintendência-Geral, conforme dito no art. 13, V, da Lei do CADE.
Analisando o pedido, não assiste razão à parte autora.
Quanto à possibilidade de controle prévio ou posterior do negócio pelo CADE, é de se dizer ser plenamente possível, porquanto como órgão regulador, é necessário o seu controle em atos que possam limitar ou prejudicar a livre concorrência, ou resultar no domínio de mercados relevantes de bens ou serviços.
Assim, ao celebrarem fusão empresarial sem a devida informação ao CADE, incorreram em infração à ordem econômica, passível, portanto, de multa a ser apurada em processo administrativo, exatamente como fez o CADE, não havendo qualquer vício a ser sanado pelo poder judiciário.
Karla, achei que você gastou muito tempo conceituando sobre o funcionamento do CADE e pouco pra analisar a questão em si. Pelo espelho da prova, creio que faltou afastar a alegação da parte, que foi no sentido que não havia a obrigatoriedade do controle prévio. O ponto nevrálgico da questão seria rebater que não poderia ter havido a fusão sem a aprovação do CADE (o que não impede que mesmo aprovado eles possam fazer algum outro tipo de controle posterior). Acho que da maneira que você escreveu, iriam te descontar uma boa parte da nota.
- Resposta: A correta abordagem da questão exige que o candidato examine: (i) - a submissão da fusão ao controle prévio do CADE. O enunciado suprime a referência ao faturamento das sociedades envolvidas, de modo a tornar menos óbvia a aplicabilidade do art. 88, § 2º, da Lei 12.529/2011. O candidato deve raciocinar a partir dos dados ofertados e, conforme a causa de pedir, a incidência do controle da autarquia é incontroversa: o que se alega é que ele pode ser posterior. A data de consumação da fusão (março de 2013) indica que o ato se dá sob a vigência da 12.529/2011. O ponto nevrálgico é justamente enfocar a mudança da legislação (advento da Lei nº 12.529/2011), que não mais permite o controle posterior, ao contrário da lei anterior (Lei 8884/94), que dava ao agente econômico a opção de submeter a operação, ao CADE, para controle prévio ou posterior (art. 54, §4º, da lei antiga). Antes de materializar o ato societário (fusão), os agentes devem submetê-lo à aprovação prévia do CADE, sob pena de nulidade e de multa (art. 88, § 3º da Lei nº 12.529/2011). O desenvolvimento satisfatório desse tema dá ensejo ao grau de até 1,0 ponto. (ii) o não cabimento da análise imediata, pelo Judiciário, da aferição sobre se o CADE deve ou não autorizar o negócio por razoabilidade pode prestigiar um ou alguns princípios da ordem econômica (art. 170, CR/88) em detrimento de outros. Contudo, essa aferição ainda será feita, no prazo legal, e não cabe ao Judiciário antecipar-se ao veredicto da autarquia técnica. (iii) apesar de a multa imposta (vinte mil reais) ter valor inferior ao mínimo estipulado pelo art. 88, §3º, da Lei 12.529/2011 (sessenta mil reais), esse fato, por si só, não permite ao Juiz anulá-la, pois, no particular, o vício não prejudica o interessado. Nada impede, entretanto, a notícia do fato na decisão (multa em valor inferior ao mínimo legal). O CADE apenas determinou a abertura do procedimento administrativo e as sociedades ainda poderão apresentar suas defesas, tanto em relação à fusão, quanto em relação à multa inicialmente imposta. Outro aspecto (apenas para melhorar a avaliação): caso houvesse urgência na materialização do ato na esfera comercial, as interessadas deveriam postular no CADE na forma do art. 59, §1º c/c o art. 88, § 6º; São irrelevantes para o acerto da questão (pontuação): 1. o suporte processual considerado pelo candidato: seja examinando a inicial e mandando citar, seja fazendo-o para efeito de examinar eventual tutela antecipada, seja analisando o mérito (ideal). O importante foi aferir a questão de direito econômico, desde que o suporte processual considerado fosse adequado ao enunciado, e não fosse suprimida a análise do indagado.
2. incorreto fugir ao tema com soluções inaplicáveis. Assim: tratar de questões processuais, tais como: violação do PA ao devido processo legal/contraditório, rito da ação, errada afirmação da incompetência do juízo etc. Quanto à multa, caberia ao Juiz, na decisão, apenas noticiar a sua fixação em valor abaixo do mínimo legal, não podendo, de ofício, determinar ao CADE a sua revisão (aumento). A questão da multa abaixo do mínimo deve ser enfrentada. A mera improcedência do pedido em relação à multa, sem análise dessa questão (valor inferior ao mínimo do art. 88, §3º) não dará ensejo à pontuação integral.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA