José da Silva é proprietário de um imóvel residencial na Zona Sul do Rio de Janeiro. Em sua configuração original, dito imóvel era de dois pavimentos, sendo certo que José sempre quitou o IPTU devido, lançado anualmente pela Prefeitura do Rio de Janeiro, rigorosamente em dia.
Em 2008, desejando ampliar a área útil do imóvel, José construiu um 3º andar. A contrução foi precedida do regular pedido de licença de obras na prefeitura, das devidas comunicações à Secretaria de Urbanismo e demais providências administrativas necessárias à cientificar a administração publica municipal acerca do aumento da área útil.
Em 2011, novamente desejando ampliar a área útil do imóvel, José construiu um 4º andar. Desta vez, no entanto, não deu entrada no pedido de licença de obras, tampouco fez qualquer comunicação aos órgãos municipais competentes.
Em 2012, José recebeu lançamentos complementares do IPTU de 2008 e 2011, referentes respectivamente, às áreas dos 3º e 4º pavimentos.
Na sua opinião, procede a revisão do lançamento? Responda fundamentadamente.
A revisão de lançamento procede apenas em relação ao lançamento complementar de 2011, pois a Administração incorreu em erro de fato (não tinha conhecimento da construção do 4º andar - incidência do inciso VIII, do art. 149, CTN), não alcançado pela decadência - parágrafo único do referido artigo.
Tal possibilidade de revisão decorreu da inexatidão das informações cadastrais do imóvel, ou seja, de fato não conhecido. José deixou de informar ao município a referida ampliação. Muito embora o IPTU seja típico exemplo de tributo lançado de ofício, independente de declaração do sujeito passivo, o município constitui o crédito com base nas informações cadastrais do imóvel. Assim, se inverídicas/omissas, cabível a revisão da exação. Tal entendimento foi chancelado pelo STJ, na sistemática dos recursos repetitivos.
Diversamente, quanto à revisão relativa ao ano de 2008, impossível a complementação de ofício. Nesse caso, a municipalidade detinha plena ciência da ampliação da área construída (3º andar). Assim, deve-se proteger a confiança do contribuinte no acerto do lançamento efetuado, prevalecendo a presunção de veracidade/legitimidade do ato de exação e evitando surpresa ilegítima no ato de cobrança ulterior.
No mais, impende destacar que o erro de direito, a mudança dos critérios jurídicos adotados no lançamento (base de cálculo do IPTU), não permite à municipalidade rever fatos geradores anteriores, apenas os posteriores (efeito 'ex nunc' - teor do art. 146, CTN).
Rodrigo, sua resposta está excelente. Abordou praticamente tudo que eu acho que tinha que ser falado mesmo. Talvez tenha faltado apenas a menção ao art. 145 do CTN, exatamente o que autoriza o uso do art. 149.
De fato, as hipóteses do art. 149 são de erro de fato e a doutrina clássica entende que não pode haver retificação de ofício por erro de direito.
Segue aí uma explicação rápida que encontrei na internet sobre erro de fato e erro de direito:
A distinção entre o “erro de fato” (que autoriza a revisão do lançamento) e o “erro de direito” (hipótese que inviabiliza a revisão) é enfrentada pela doutrina, verbis: “Enquanto o “erro de fato” é um problema intranormativo, um desajuste interno na estrutura do enunciado, o “erro de direito” é vício de feição internormativa, um descompasso entre a norma geral e abstrata e a individual e concreta.
Assim constitui “erro de fato”, por exemplo, a contingência de o evento ter ocorrido no território do Município “X”, mas estar consignado como tendo acontecido no Município “Y” (erro de fato localizado no critério espacial), ou, ainda, quando a base de cálculo registrada para efeito do IPTU foi o valor do imóvel vizinho (erro de fato verificado no elemento quantitativo).
“Erro de direito”, por sua vez, está configurado, exemplificativamente, quando a autoridade administrativa, em vez de exigir o ITR do proprietário do imóvel rural, entende que o sujeito passivo pode ser o arrendatário, ou quando, ao lavrar o lançamento relativo à contribuição social incidente sobre o lucro, mal interpreta a lei, elaborando seus cálculos com base no faturamento da empresa, ou, ainda, quando a base de cálculo de certo imposto é o valor da operação, acrescido do frete, mas o agente, ao lavrar o ato de lançamento, registra apenas o valor da operação, por assim entender a previsão legal. A distinção entre ambos é sutil, mas incisiva.” (Paulo de Barros Carvalho, in “Direito Tributário – Linguagem e Método”, 2ª Ed., Ed. Noeses, São Paulo, 2008, págs. 445/446) “O erro de fato ou erro sobre o fato dar-se-ia no plano dos acontecimentos: dar por ocorrido o que não ocorreu. Valorar fato diverso daquele implicado na controvérsia ou no tema sob inspeção. O erro de direito seria, à sua vez, decorrente da escolha equivocada de um módulo normativo inservível ou não mais aplicável à regência da questão que estivesse sendo juridicamente considerada. Entre nós, os critérios jurídicos (art. 146, do CTN) reiteradamente aplicados pela Administração na feitura de lançamentos têm conteúdo de precedente obrigatório. Significa que tais critérios podem ser alterados em razão de decisão judicial ou administrativa, mas a aplicação dos novos critérios somente pode dar-se em relação aos fatos geradores posteriores à alteração.” (Sacha Calmon Navarro Coelho, in “Curso de Direito Tributário Brasileiro”, 10. ed., Ed.Forense, Rio de Janeiro, 2009, pág. 708
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SENTENÇA