Discorra sobre a seguinte assertiva: Com as últimas reformas legislativas, alguns artigos do CPP, com traços do sistema penal inquisitório, foram revogados ou alterados, mas persistem dispositivos em descompasso com o sistema constitucional acusatório.
Três são os sistemas processuais existentes: inquisitório, acusatório e misto.
O sistema inquisitório se baseia na centralização do poder, ou seja, reúne no magistrado as funções de acusar, defender e julgar, sendo que o réu é visto como objeto da persecução e não há contraditório.
Já no sistema acusatório há a defesa dos direitos fundamentais do acusado, separando-se as funções de acusar, defender e julgar. O juiz é o órgão imparcial que julgará a causa; o autor é quem fará a imputação, assumindo o ônus da acusação; e o réu se defende utilizando-se de todos os meios em direito admitidos. Neste sistema, prima-se pelo contraditório e pela iniciativa probatória das partes.
Por fim, no sistema misto há a fase inicial inquisitiva, que se consubstancia numa investigação preliminar e a fase final, em que se garantem todas as garantias do sistema acusatório.
Parte da doutrina entende que o Brasil adota o sistema acusatório, mas não na sua forma pura, destacando o inquérito policial como exceção à regra.
No entanto, para maioria da doutrina o sistema adotado pelo Brasil é o misto, uma vez que as investigações preliminares estão concentradas nas mãos do Estado (inquérito policial ou investigações realizadas pelo Ministério Público) e na ação penal propriamente dita há o sistema acusatório, na forma do artigo 129, I da Constituição.
As recentes alterações realizadas no Código de Processo Penal diminuíram ainda mais os poderes do magistrado, concretizando-se o sistema acusatório.
Neste sentido, a novel legislação alterou o momento do interrogatório, ressaltando seu caráter de meio de defesa, bem como passou-se a permitir que as partes indaguem as testemunhas diretamente e antes do magistrado, por exemplo.
No entanto, remanescem dispositivos em descompasso com o sistema acusatório, como o artigo 156 do CPP que autoriza a produção de provas de ofício pelo juiz e o artigo 385 do CPP que permite que o magistrado condene o réu mesmo nos casos em que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição.
Resposta bem escrita, mas acho que deveria evitar expressões taxativas como: "Três são os sistemas processuais existentes", "para maioria da doutrina o sistema adotado pelo Brasil é o misto". Muito mais que "sistemas" tal classificação é baseada nas características predominantes, acho perigoso estabelecer como conceitos fechados.
Quanto ao sistema que a doutrina acha que o Brasil adotou, há divergência terrível, mas me parece que predomina um sistema acusatório mitigado, ou não puro. Pois não é um processo "de partes", como no sistema adversarial dos EUA. No Brasil o juiz exerce uma função de garantidor dos direitos fundamentais do acusado, além de deter certo grau de ingerência "favor rei", com intuito de equilibrar a balança (paridade de armas).
No mais, o sistema misto se caracteriza sim por duas fases uma inquisitorial e outra acusatória, porém ambas geram relação jurídica processual entre os sujeitos, fato que diverge do modelo brasileiro, onde a fase inquisitorial é mero procedimento preparatório e dispensável.
Por fim, acredito que usar o exemplo do art. 385 do CPP como norma inquisitória é errada. Isso é explicado muito bem pelo Afrânio, onde ele afirma e fundamenta que, não fosse tal dispositivo, quem acabaria por decidir entre a condenação/absolvição seria o próprio MP (pelo menos no que toca à absolvição), afastando assim o livre convencimento do juiz. Ou seja, por mais estranho que pareça, o art. 385 reforça a divisão de funções e não ao contrário. No mesmo sentido o famoso art. 28 do CPP, não fosse ele o Promotor teria um poder desmedido, sem freios/controle.
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